Chade: milhares de refugiados centro-africanos em Ndjamena

O futuro incerto daqueles que fugiram da violência em seu país

Nos últimos dois meses, mais de 15 mil pessoas de Bangui chegaram de avião a Ndjamena. Um total de 100 voos foram organizados pelas autoridades chadianas e pela Organização Internacional para Imigração (OIM). Os refugiados estão abrigados em centros sociais e escolas. Após terem fugido da violência extrema, eles estão, agora, longe de casa, sem qualquer esperança de retornar, diante do futuro incerto no Chade.

Uma pessoa desavisada pode andar em frente ao prédio sem ao menos imaginar que ali vivem centenas de refugiados. Alguns soldados controlam a entrada e a saída do portão. Uma vez passado esse portão, há pessoas por todo o canto, malas, bolsas. São, em sua maioria, mulheres e crianças, mas há também alguns homens jovens e idosos. De acordo com um representante do Ministério de Assuntos Sociais do Chade, há cerca de 500 pessoas vivendo no centro Clément. Há diversos outros centros como este em Ndjamena, capital do país. Em uma mesma manhã, 100 pessoas da República Centro-Africana foram transferidas para um acampamento em Gore, no sul do país. “O que vamos fazer em Gore”, perguntou um homem de 18 anos, que chegou sozinho. “Há uma escola lá?”  

A maioria das pessoas veio de avião de Bangui. “Depois que meu pai foi morto e sua loja saqueada, minha mãe e minha irmã quiseram fugir com nosso caminhão. Eu não quis. Por que ir ao Chade? Fazer o quê? A República Centro-Africana é o meu país, eu nasci em Bangui, assim como meus pais”, afirma Mahmat, de 18 anos. Ele havia decidido ficar em Bangui com seu irmão mais velho e, então, soube que o comboio em que estavam sua mãe e irmã fora atacado. Ele não sabe se elas estão vivas. “Um pouco depois, consegui ir ao mercado”, ele diz. “No caminho de volta, soube que nosso vizinho estava sendo atacado. Encontrei meu irmão e alguns vizinhos nos deram carona. Os dois veículos que nos seguiam foram atingidos por granadas. Conseguimos, finalmente, chegar ao aeroporto. Foi terrível. Todos corriam, inclusive eu, para chegar ao avião.” Foi nesse momento que Mahmat foi separado de seu irmão e não teve notícias dele desde então.

“Ao menos aqui não ouvimos tiros”, conta um jovem que testemunhou o assassinato de sua família em Bangui. Ele se escondeu na casa de um vizinho, embaixo da cama. Depois, conseguiu chegar à embaixada chadiana, onde centenas de pessoas buscaram refúgio e segurança. Dois ou três dias depois, a embaixada foi atacada. O exército chadiano escoltou as pessoas até o centro de trânsito do aeroporto, onde o jovem embarcou em um avião para Ndjamena.

Halima também passou alguns dias na superlotada embaixada do Chade em Bangui, antes de ser escoltada para o aeroporto com seus dois filhos mais velhos. Ela está com seu terceiro filho no colo, um bebê de nove dias nascido em Ndjamena. Ela está entre as pessoas que têm parentes no Chade. As autoridades chadianas e a OIM estão procurando os familiares das daqueles que têm origem chadiana. Os pais de Halima, que vivem em Ndjamena, vieram visitá-la, mas disseram não ter espaço para abrigar a ela e a seus filhos.
 
No centro, as autoridades chadianas distribuem cobertores e alimentos. Alguns cozinheiros estão preparando três refeições por dia para as 600 pessoas que estão vivendo no centro.
 
Pode-se perceber uma mulher próximo da cerca. Ela esconde seu rosto com um lenço e parece imóvel. Seu filho é quem conta a história. Eles são membros da etnia Peuhl, criadores de gado. Eles estavam em seu terreno quando os anti-Balaka vieram e incendiaram o local. O rosto dele foi queimado e parte do corpo de sua mãe também. Ela viu seis de seus filhos morrerem naquele dia.
 
Centenas de pessoas aqui não sabem o que o future lhes reserva. Elas viram suas casas, pertences e familiares desaparecerem e se salvaram depois de fugirem da violência. Mas aqui, em Ndjamena, nada lhes é familiar.
 
Em meados de fevereiro, MSF começou a realizar consultas médicas para refugiados recém-chegados nos locais para onde foram transferidos. Equipes móveis em alguns desses locais se depararam com muitos pacientes em necessidade de cuidados básicos de saúde, com diarreia, infecções do trato respiratório, doenças sexualmente transmissíveis e alguns casos de pós-operatório grave que precisam de monitoramento contínuo. Há uma necessidade crescente por atividades de água e saneamento, às quais as equipes de MSF estão prestando suporte. A organização também estruturou operações no sul do país, em Bitoye e Sido, onde 25 mil refugiados chegaram.

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