“Obrigado, Pernambuco, por renovar as minhas esperanças”

O analista da Unidade Médica Brasileira (Bramu) de MSF, Caio Dério, conta como foi atuar no projeto de saúde mental após as graves enchentes em Pernambuco.

Desde que ingressei em MSF-Brasil, em 2018, tive como sonho participar dos projetos no terreno e, quando eu menos esperava, em março de 2022, recebi uma mensagem perguntando se poderia ir para Petrópolis, Região Serrana do Rio, devido aos deslizamentos após o temporal que atingiu a cidade; e ir em 3 dias.

Essa é uma das coisas inevitáveis numa situação de emergência, a emergência e o que ela implica. Poucos meses depois, em junho, em Pernambuco, aconteceu o mesmo. E apesar de já estar ciente da possibilidade de ir quando as chuvas começaram, tive a certeza apenas alguns dias antes, ou seja, arrumar a mala e me preparar para ficar o tempo necessário e dizer à família que esse tempo seria indeterminado.

Em junho, Pernambuco enfrentou uma de suas maiores tragédias, resultando em enchentes e deslizamentos devido às chuvas constantes. Médicos Sem Fronteiras (MSF) identificou que poderia oferecer apoio dando suporte na área de saúde mental e, por isso, uma equipe de psicólogos foi organizada para ir. Como não sou psicólogo, atuei como SLAF (Suprimentos, Logística, Administração e Financeiro), que é a pessoa responsável por cuidar desses pilares numa equipe pequena, o que é diferente numa equipe e projetos maiores.

Um dos maiores desafios é conhecer a região nos primeiros dias, principalmente durante uma situação de emergência, no sentido de ver os lugares e poder fazer uma conexão de como são e o que há no entorno. Para mim, é como se aos poucos o mapa daquela cidade estivesse se formando, o que pode ser um pouco desesperador porque leva certo tempo e perguntas começam a aparecer em sua cabeça como: “Caso eu esteja indo ao mercado e chova muito forte, para onde eu iria? Quais ruas eu poderia entrar? Aquele lugar é alto o suficiente para me abrigar caso a rua inunde?”

Claro que MSF tem protocolos de segurança e a equipe está em constante contato com a Defesa Civil local, mas mesmo assim, diante do perigo, as coisas podem não ocorrer como o esperado. E isso me faz pensar sobre a população que vive nos locais onde aconteceram os desabamentos. As perguntas em minha cabeça eram momentâneas, e eu sabia que estava em um local seguro, mas e as pessoas que convivem com o medo constante? Aos poucos, associei qualquer sinal de chuva a um possível desastre.

Também pude conversar com algumas pessoas durante nossas visitas em lugares afetados e testemunhei além de tudo resiliência. O povo pernambucano, mesmo diante da adversidade, se uniu para tentar atravessar esse momento da melhor forma que encontrou, e em todos os locais que estivemos, fomos bem recebidos por pessoas dispostas a compartilhar suas histórias e ajudar.

Encontramos famílias inteiras arrasadas, locais destruídos, mas também esperança no dia seguinte . Pessoas ajudando outras pessoas, o ser humano no que eu acredito ser a sua melhor essência.
Muito obrigado, Pernambuco, por renovar as minhas esperanças.

Em junho deste ano, uma equipe de MSF atuou em Pernambuco para dar suporte aos profissionais de saúde locais no enfrentamento das consequências das fortes chuvas que ocorreram no final de maio na Região Metropolitana do Recife. O foco foi o apoio e a capacitação em saúde mental. O público-alvo foram os profissionais da área de saúde, educação e assistência social, além de lideranças comunitárias que estão na linha de frente.

 

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