A ponte em lianas

O logístico Hugo Agostinho recorda os desafios que há que ultrapassar para chegar a pacientes nas periferias da cidade de Mulungo

Estradas pavimentadas são raras e as estruturas de saúde poucas, o que faz com que na MSF tenhamos de ser especialmente criativos para conseguir alcançar as populações, sobretudo nas zonas mais remotas e periféricas em Kivu do Sul.

Vamos onde os outros não chegam, e mesmo quando apenas os nossos recursos não chegam.

Uma manhã de sábado chegou-nos a notícia de que a ponte tinha caído… a 22ª ponte que separava os últimos cinco quilómetros do centro de saúde onde semanalmente prestamos apoio. Os curtos 25 quilómetros percorridos de uma extenuante jornada de três horas em cima de uma mota nunca pareceram tão impossíveis de ultrapassar. E a desilusão era partilhada entre a equipa da MSF, o staff do Zona de Saúde e a frágil população. Como chegar agora às crianças, mães e mulheres vítimas de desnutrição, de malária e de violência sexual? E o suporte humano e material aos centros de saúde para lá desta nova barreira tão complexa de transpor?

Não passaram três semanas e a (não tão) frágil população encontrou uma solução. Uma ponte em lianas, sobre a qual se contavam 35 passos – cerca de 20 metros – num abismo sobre o rio Lubimbe que corria ferozmente uns 20 metros debaixo dos nossos pés!

Não tardou a que às três horas de mota, se acrescentasse uma hora de caminhada pela antiga estrada colonial engolida pela floresta, da qual apenas resta um estreito carreiro cujo piso mais comum é uma lama pegajosa, produto da quase diária presença da chuva.

E algumas semanas mais tarde acrescentaram-se também um dia e meio de caminhada, montanha acima montanha abaixo, floresta fora, para chegar a outro centro de saúde a 35 quilómetros de distância.

As imagens que ficam são da floresta verde salpicada de uma gente de colete branco atrás de uma fila de corajosos voluntários das diversas aldeias transportando preciosa carga.

Nos meus ouvidos ainda soa a canção “MSF, a MSF quem é? São médicos e enfermeiros! E o que estão a fazer? Estão a cuidar gratuitamente da saúde da nossa população!” cantada por dezenas de crianças a cada aldeia que, do nada, surgia pelo caminho.

No dia em que deixei a República Democrática do Congo recebi o telefonema do nosso logístico de periferia. “Papa Hugo, le pont est déjà réparé!”  (Papá Hugo, a ponte já está reparada!).

Estamos agora uma hora mais perto do nosso objectivo!

 

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