“Saio deste projeto com um forte sentimento de gratidão”

Hívina, profissional de MSF, no Rio Grande do Sul. ©Arquivo pessoal

A psicóloga Hívina Machado compartilha os desafios e realizações de seu trabalho com MSF em resposta à emergência no estado do Rio Grande do Sul

Trabalhamos no Rio Grande do Sul, no vale do Taquari, uma região duramente afetada pelas recentes enchentes, ocorridas entre o final de abril e início de maio de 2024, com o nível do rio acima de 30 metros. A população local sofreu perdas significativas e enfrenta grandes dificuldades para reconstruir suas vidas. O cenário é de devastação, mas também de resiliência, enquanto as comunidades tentam se reerguer.

Iniciamos o projeto de saúde mental no pico da crise, com a chegada da primeira equipe de psicólogos e promotores de saúde de Médicos Sem Fronteiras (MSF). A ação foi rápida e coordenada para oferecer suporte psicossocial às vítimas. Em pouco tempo, conseguimos estabelecer uma base operacional e começar a atender as necessidades emergenciais da população impactada.

Durante a crise, as reações esperadas entre os profissionais e a população incluíram medo, desesperança, sentimentos de impotência, alteração no sono e apetite, e um estado de alerta constante. Esses sintomas são comuns  em situações de desastre e refletem o impacto profundo que tais eventos têm sobre a saúde mental.

Paisagem devastada após inundações. ©Arquivo pessoal

No entanto, é importante dizer que, com o passar do tempo, grande parte  das pessoas afetadas provavelmente não desenvolverá transtornos mentais significativos e conseguirá assimilar a situação aos poucos. Por isso, é fundamental criar estratégias de enfrentamento e potencializar as ações de autocuidado no dia a dia.

Minha atuação como psicóloga se concentrou no cuidado ao cuidador. Iniciamos com uma etapa de acolhimento dos profissionais da linha de frente, oferecendo suporte emocional e criando um espaço seguro para que pudessem expressar suas preocupações e desafios. Em seguida, realizamos uma etapa de sensibilização e capacitação, abordando estratégias para manejar as reações esperadas no contexto do desastre. Essa capacitação visou munir os profissionais com ferramentas para enfrentar o estresse agudo e as emoções intensas que surgem em um ambiente tão desafiador.

Apesar dos desafios enfrentados, a atuação foi profundamente gratificante. A troca significativa que ocorreu foi um dos aspectos mais valiosos do trabalho. Saber que conseguimos, de alguma maneira, acolher as angústias dos profissionais e compartilhar conhecimentos que os empoderam em seus atendimentos trouxe um senso profundo de realização.

A resiliência das pessoas é notável, e ver o resultado positivo de nosso trabalho na vida dos profissionais e na comunidade foi uma experiência enriquecedora. Saio deste projeto com um forte sentimento de gratidão e uma renovada apreciação pelo poder do apoio à saúde mental e da capacitação em momentos de crise.

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