Apesar da calma, ciclo de violência deve se repetir na província de Ituri, na República Democrática do Congo

O acampamento para pessoas deslocados de Rhoe, em Ituri, viu o número dos seus residentes aumentar para mais de 65 mil pessoas até dezembro de 2021

Foto: Alexis Huguet/MSF

A violência devastadora atormenta as pessoas no território de Djugu, província de Ituri, nordeste da República Democrática do Congo (RDC), desde 2017, à medida que as tensões comunitárias desencadearam o ressurgimento de um conflito armado.

Quatro ataques consecutivos de violência sem precedentes atingiram as localidades de Tché, Drodro, Paroisse, Luko e Ivo, entre 12 e 28 de novembro de 2021. Esta nova escalada do conflito agravou a situação humanitária e de segurança nos assentamentos para deslocados internos na região, ao mesmo tempo que aumenta a vulnerabilidade e o isolamento da população.

“Estou entregue ao meu próprio destino. Sem comida, meus filhos e eu estamos doentes desde que chegamos ao local”, diz Suzanne, uma agricultora de 52 anos de Dhedja, que fugiu para Ivo com seus três filhos.

Esta é a segunda vez que ela é forçada a fugir. Desta vez, para o acampamento de deslocados de Rhoe. Em Ivo, ela viu pessoas sendo baleadas e ouviu seus vizinhos serem atacados com facões enquanto ela conseguia escapar com sua família. As imagens de seus vizinhos sendo massacrados são passadas repetidamente em sua mente enquanto ela enfrenta dificuldades para sustentar seus filhos com poucas perspectivas de futuro.

Como Suzanne, mais de 40 mil pessoas foram forçadas a se refugiar no acampamento de Rhoe, na área de saúde do estado de Blukwa. Uma área de difícil acesso e onde os grupos humanitários têm uma presença reduzida devido a problemas recorrentes de segurança.

“As pessoas têm enfrentado muitas dificuldades: frio, falta de abrigos e de latrinas. Confrontos entre grupos armados levaram ao deslocamento em massa de pessoas, incluindo profissionais de saúde que não estão mais ao lado de seus pacientes”, diz o Dr. Benjamin Safari, pediatra de Médicos Sem Fronteiras (MSF) em Drodro. “As necessidades de saúde são enormes. Iniciamos várias atividades para reforçar a nossa resposta, especialmente para os menores de 15 anos”, afirma.

Foto: Alexis Huguet/MSF

Originalmente, a clínica instalada no acampamento era destinada a encaminhar pacientes que necessitavam de cuidados mais intensivos para o hospital geral de referência mais bem equipado na cidade de Drodro. No entanto, após os últimos confrontos que destruíram partes de Drodro e forçaram as pessoas a entrar no acampamento de Rhoe, nossas equipes transformaram a clínica em um hospital de campanha para ajudar as agora mais de 65 mil pessoas – um aumento de 40 mil pessoas em dois meses.

Nas últimas semanas, nossas equipes realizaram uma média de mais de 800 consultas por semana, atenderam 35 partos e trataram dezenas de pacientes que necessitavam de cuidados de saúde mental. Adicionalmente, nossas equipes de promoção da saúde têm realizado no local sessões de sensibilização para a saúde com o objetivo de detectar casos de desnutrição aguda, doenças com potencial epidêmico e fornecer informação sobre serviços de apoio a sobreviventes de violência sexual.

“Embora algumas pessoas estejam começando a voltar para suas casas, na frágil e relativa calma das últimas semanas, as necessidades continuam altas e nosso acesso às pessoas é limitado”, diz Davide Occhipinti, coordenador do projeto de MSF em Drodro. “Não poderemos acompanhar essas pessoas até Drodro se não for seguro para a equipe de saúde”, diz ele.

Foto: Alexis Huguet/MSF

“Aqueles que permanecem em Rhoe não têm para onde ir. As comunidades que estão em meio ao combate na região foram negligenciadas por muito tempo, não vamos resolver seus problemas com bandagens e remédios. O Estado congolês e seus parceiros internacionais precisam assumir a responsabilidade de reverter a dinâmica desse ciclo vicioso que leva a cada vez mais mortes, feridos e deslocamentos”, diz Occhipinti.

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