Ausência de operações de busca e resgate no Mediterrâneo Central traz risco crítico de mais mortes no mar

As organizações Médicos Sem Fronteiras (MSF), SOS Méditerranée e Sea-Watch pedem o fornecimento urgente de recursos marítimos de busca e salvamento liderados pelo bloco europeu no Mediterrâneo Central.

Foto: Lorène Giorgis/MSF
Foto: Lorène Giorgis/MSF

Em cinco dias, o Geo Barents, navio de busca e resgate operado por MSF, e o Ocean Viking, a embarcação administrada pela SOS Méditerranée em parceria com a Federação Internacional das Sociedades da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho, resgataram 16 barcos em perigo. Na semana anterior, a Sea-Watch 3 conseguiu salvar cinco barcos em perigo no mar, com um total de 444 sobreviventes. Sem a presença de recursos civis de busca e salvamento no Mediterrâneo Central, as crianças, mulheres e homens resgatados durante essas operações de salvamento teriam sido deixados à própria sorte em águas internacionais da Líbia, na rota de migração marítima mais mortal do mundo desde 2014.

A retirada da capacidade marítima europeia das operações de busca e salvamento no Mediterrâneo Central, bem como os atrasos na atribuição de um local de segurança para o desembarque, comprometeram a integridade e a capacidade do sistema de busca e salvamento e, consequentemente, de salvar vidas.

Apesar de, como prescrito pelo direito marítimo, buscarmos sistematicamente a coordenação de nossas operações, as autoridades marítimas líbias quase nunca respondem, negligenciando sua obrigação legal de coordenar a assistência. Além disso, quando intervêm e interceptam embarcações em perigo, as autoridades marítimas líbias devolvem sistematicamente os sobreviventes à Líbia, o que, segundo a Organização das Nações Unidas (ONU), não pode ser considerado um local seguro.

Enquanto isso, apesar da falta crítica de recursos adequados de busca e salvamento neste trecho marítimo, as pessoas continuam sendo forçadas a fugir da Líbia pelo mar, arriscando suas vidas em busca de segurança. Agora, durante o verão nesta área, quando as condições climáticas são as mais favoráveis para tentar uma viagem tão perigosa, partidas da Líbia são mais frequentes e, portanto, é necessária uma grande frota de busca e resgate.

“Desde o início da temporada de verão, nossa equipe realizou três operações no mar. Infelizmente, o primeiro resgate terminou tragicamente, com quase 30 pessoas desaparecidas e uma mulher que não sobreviveu”.

– Juan Matias Gil, representante de busca e resgate de MSF.

“As outras duas operações foram muito intensas, com seis resgates em 12 horas e outros 11 em 72 horas, salvando um total de 974 pessoas. Devido ao estado de necessidade, o Geo Barents navegou acima de sua capacidade, com 659 pessoas a bordo da embarcação. Continuamos recebendo alertas que haviam sido deixados sem resposta ou avistando barcos em perigo. É nosso dever legal e moral não deixar essas pessoas se afogarem. Cobrir o vazio da frota de busca e salvamento liderada pelo estado não é suficiente dadas as necessidades, e o aumento da capacidade no Mediterrâneo Central é mais do que necessário”, complementa.

Foto: Anna Pantelia/MSF
Foto: Anna Pantelia/MSF

O Sea-Watch 3 desembarcou 438 pessoas em Taranto, Itália, em 30 de julho, e o Ocean Viking desembarcou 387 mulheres, crianças e homens resgatados entre 24 e 25 de julho em Salerno, Itália, em 1º de agosto. Após nove longos dias de espera por um local seguro, o Geo Barents recebeu autorização para desembarcar os 659 sobreviventes em 5 de agosto, em Taranto. O desembarque foi concluído no dia 6 de agosto.

“Manter sobreviventes presos no mar por dias esperando para desembarcar em um local seguro é uma violência adicional imposta a pessoas já extremamente vulneráveis. Sobreviventes resgatados pelo Ocean Viking nos últimos seis anos têm contado para nossas equipes histórias angustiantes de violência e abuso sofridos. A última e única esperança que eles carregam é conseguir fugir da Líbia, que muitas vezes chamam de ‘inferno na terra’, através do mar, independentemente dos riscos. A retirada de serviços europeus de busca e salvamento adequados e competentes em águas internacionais da Líbia provou ser mortal e ineficaz na prevenção de travessias perigosas”, diz Xavier Lauth, diretor de operações da SOS Mediterranée.

“Enquanto as autoridades europeias não estão dispostas a cumprir seu dever de resgatar pessoas no mar, elas também estão atrasando o desembarque de pessoas resgatadas por ONGs. Esta espera desnecessária por dias esgota as pessoas resgatadas: elas sobreviveram ao Mediterrâneo, mas em vez de encontrar segurança, têm que esperar por dias nos portões fechados da Europa para que seus direitos humanos sejam respeitados”, diz Mattea Weihe, porta-voz da Sea-Watch.

Médicos Sem Fronteiras (MSF), SOS Mediterranée e Sea-Watch exigem que os Estados-membros europeus e associados forneçam uma frota de busca e salvamento adequada e proativa liderada pelo Estado no Mediterrâneo Central, além de uma resposta rápida e adequada a todos os pedidos de socorro, bem como um mecanismo previsível de desembarque de sobreviventes.

Foto: Lorène Giorgis/MSF
Foto: Lorène Giorgis/MSF

MSF realiza operações de busca e salvamento no Mediterrâneo Central desde 2015, trabalhando em oito embarcações diferentes (sozinha ou em parceria com outras ONGs). Desde 2015, nossas equipes prestaram assistência vital a mais de 80 mil pessoas em perigo no mar. MSF retomou as atividades de busca e salvamento no Mediterrâneo Central em maio de 2021, fretando seu próprio navio, o Geo Barents, para salvar vidas, fornecer atendimento médico de emergência a pessoas resgatadas, bem como fazer com que as vozes dos sobreviventes sejam ouvidas da fronteira marítima mais mortal do mundo.

SOS Mediterranée é uma organização humanitária e marítima europeia de busca e salvamento que opera no Mediterrâneo Central. Foi fundada por cidadãos em maio de 2015, em resposta às mortes no Mediterrâneo e ao fracasso da União Europeia em preveni-las. De fevereiro de 2016 a dezembro de 2018, a SOS Mediterranée fretou e operou o navio de resgate Aquarius. Desde agosto de 2019, a organização freta e opera o Ocean Viking. Desde o início de suas operações, resgataram e ajudaram mais de 36 mil pessoas em perigo no mar.

Sea-Watch é uma organização não governamental sem fins lucrativos (ONG), que conduz operações de busca e salvamento no Mar Mediterrâneo Central por mais de seis anos, documenta violações de direitos humanos e denuncia pessoas em perigo usando aviões de reconhecimento civil.

 

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