Cinco perguntas e respostas sobre o surto de mpox na RDC

Entenda o surto de mpox (varíola dos macacos) na República Democrática do Congo, onde o número de casos tem aumentado muito nos últimos meses

Equipe de promoção de saúde compartilhando informações sobre mpox em acampamento de pessoas deslocadas na RDC. ©Augustin Mudiayi/MSF

Na República Democrática do Congo (RDC), os casos de mpox (doença também conhecida como varíola dos macacos) estão em ascensão há mais de dois anos. A situação, no entanto, piorou nos últimos meses, quando houve um aumento no número de pessoas afetadas, uma mutação que levou à transmissão do vírus de humano para humano e a notificação de casos suspeitos em locais para pessoas deslocadas na província de Kivu do Norte.

Qual é a situação no país e o que as equipes de Médicos Sem Fronteiras (MSF) estão fazendo para lidar com essa nova emergência? Confira as respostas de Louis Albert Massing, coordenador médico de MSF na RDC.

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O que é mpox e que riscos representa?

Mpox é uma doença causada pelo vírus da varíola dos macacos. É transmitida por contato próximo entre indivíduos ou com animais infectados. Tem sido endêmica na África Central e na África Ocidental, com duas cepas diferentes, desde a década de 1970. Entre 2020 e 2023, se espalhou rapidamente pelo mundo, com dezenas de milhares de casos ligados à variante da África Ocidental relatados em mais de 110 países.

Em termos práticos, a mpox causa erupções cutâneas, lesões e dor, que requerem tratamento “de suporte” para controlar os sintomas da forma mais eficaz possível e evitar mais complicações. A maioria dos pacientes tratados se recupera dentro de um mês, mas a doença pode ser fatal se não for tratada. Na RDC, onde a taxa de mortalidade da cepa existente é muito maior do que na África Ocidental, mais de 479 pessoas morreram desde o início de 2024. Para se ter uma ideia, a Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que a mpox causou a morte de 89 pessoas em todo o mundo em 2022.

Qual é a situação na RDC?

Historicamente, a doença é endêmica em 11 das 26 províncias do país. No entanto, o número de casos vem aumentando acentuadamente há mais de dois anos, o que levou autoridades de saúde a declarar uma epidemia em dezembro de 2022. O número de casos triplicou em 2023, com mais de 14.600 casos suspeitos notificados e 654 óbitos. Mas em 2024 a situação piorou ainda mais. Entre janeiro e meados de julho, mais de 12.300 casos suspeitos foram relatados e 23 províncias foram afetadas.

A aceleração da epidemia é preocupante, especialmente porque uma mutação genética foi identificada na província de Kivu do Sul, com a transmissão de humano para humano agora ininterrupta por meses. Isso ainda não havia sido identificado com a cepa da Bacia do Congo, ao contrário da cepa da África Ocidental, que causou a epidemia global em 2022. Além dessa mutação, outro motivo de preocupação é que a doença tenha sido registrada nos acampamentos de pessoas deslocadas em torno de Goma, em Kivu do Norte, onde a extrema densidade populacional está tornando a situação muito crítica. Existe um risco real de agravamento da situação, dados os enormes movimentos populacionais dentro e fora da RDC.

A identificação de casos, o acompanhamento dos pacientes e os cuidados disponíveis permanecem extremamente limitados, enquanto a falta de vacinas dificulta ainda mais a situação. Em algumas comunidades, a desinformação sobre a doença também complica a adesão das pessoas às medidas de saúde pública. Isso ilustra a necessidade de trabalhar em estreita colaboração com os líderes comunitários para que todos passem a aderir às medidas. MSF está pedindo a mobilização de todos os envolvidos na resposta e que as populações em maior risco sejam protegidas o mais rápido possível com a vacinação.

Qual é a situação das vacinas na RDC?

A RDC validou duas vacinas e está tentando obter suprimentos, mas no momento nenhuma vacina ainda está disponível. As negociações estão em andamento com certos países e as áreas prioritárias estão sendo identificadas. Esperamos que as coisas sejam resolvidas em breve e que vacinas suficientes sejam fornecidas ao país para atuar nas principais áreas epidêmicas.

Equipe de promoção de saúde compartilhando informações sobre mpox em acampamento de pessoas deslocadas na RDC. ©Augustin Mudiayi/MSF

O que as equipes de MSF estão fazendo?

Estamos trabalhando de várias maneiras para ajudar a conter este surto. Esta não é a primeira vez: as atuações de emergência já foram realizadas em 2021 na província de Mai-Ndombe, depois em 2023 e no início de 2024 na província de Equateur. Mas estamos intensificando nossos esforços devido aos desenvolvimentos recentes.

Desde meados de junho, uma de nossas equipes apoia a região de Uvira, em Kivu do Sul. Estamos apoiando a prestação de cuidados a pessoas com sintomas graves no hospital geral de referência de Uvira e o acompanhamento ambulatorial de pacientes com formas mais leves da doença, isolando casos suspeitos. Nossas equipes estão treinando a equipe médica na gestão médica e também estão envolvidas no controle de infecções e na conscientização da comunidade. Em Uvira, nas últimas cinco semanas, mais de 420 pacientes já foram tratados por MSF, incluindo 217 casos graves. Também estamos fornecendo aos hospitais kits para tratamento e coleta de amostras.

Profissionais de saúde no hospital de Budjala, onde MSF apoia com a resposta de emergência ao surto de mpox. © Pape Cire Kane/MSF

Em Kivu do Norte, estamos trabalhando com vigilância de novos casos e sensibilização nos locais de onde vivem pessoas deslocadas internamente em Goma, onde também estamos presentes. Estamos fortalecendo as estruturas de cuidados de saúde em termos de triagem, isolamento e gestão de pacientes com sintomas de mpox.

No noroeste da RDC, atuamos em outros dois lugares: na região de Bikoro, em Equateur, e na região de Budjala, em South-Ubangi. Em ambas, ficaremos por vários meses. Também planejamos capacitar a equipe médica em cuidados médicos e psicológicos, fortalecendo a vigilância epidemiológica, o controle e a prevenção de infecções, incluindo a conscientização da comunidade, particularmente para populações que às vezes são mais difíceis de envolver, como pessoas com deficiência.

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Em Budjala, 329 pacientes foram tratados com o nosso apoio entre meados de junho e meados de julho. Na província de Equateur, também realizaremos pesquisas operacionais com as autoridades de saúde para entender melhor a dinâmica do vírus e como combater a doença.

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Quais devem ser as prioridades imediatas?

A epidemia está se espalhando em áreas com realidades demográficas e geográficas às vezes muito diferentes. A resposta à epidemia deve ser não apenas multissetorial, mas também adaptada a cada contexto. Enquanto se aguarda a chegada das vacinas, o maior número possível de parceiros deve apoiar outros aspetos-chave da resposta, como análises laboratoriais, vigilância, apoio ao isolamento e autoisolamento, sensibilização, etc. E, claro, atendimento ao paciente. Hoje, todos esses aspectos sofrem de deficiências e exigem enormes recursos para funcionar adequadamente.

Quanto ao resto, como eu estava dizendo, só podemos pedir que as vacinas cheguem ao país o mais rápido possível e em grandes quantidades, para que possamos proteger as populações nas áreas mais afetadas. Particularmente, as populações mais em risco, como os profissionais de saúde congoleses, que estão na linha de frente do combate à infecção assim como outras populações em risco, como profissionais do sexo e pessoas deslocadas nos acampamentos.

 

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