Durante meses, a suspensão de atividades de vacinação colocou crianças em risco na Libéria

Representante de MSF no país detalha como se deu a retomada da oferta desses cuidados e as medidas de prevenção necessárias em contexto de Ebola

liberia-msf143555-ebola-sarampo-adolphus-mawolo

Atividades de vacinação de rotina em países da África Ocidental afetados pelo Ebola foram significativamente reduzidas desde o início da epidemia. Na província de Montserrado, na Libéria, a organização humanitária internacional Médicos Sem Fronteiras (MSF) conduziu, recentemente, uma campanha de vacinação contra o sarampo com protocolos de segurança adaptados. Philippe Le Vaillant, representante de MSF na Libéria, fala sobre a necessidade de ampliar a cobertura vacinal enquanto a confiança nos serviços médicos é restabelecida.

Como a epidemia de Ebola afetou a vacinação de rotina das crianças na Libéria?
Como aconteceu com todos os demais serviços médicos no país, o surto de Ebola reduziu significativamente as atividades de vacinação também. As autoridades liberianas reportaram que o número de crianças vacinadas por mês caiu 60% no final de 2014. A cobertura da vacinação contra o sarampo também foi reduzida a 58%, enquanto o nível mínimo aceitável deveria ser de ao menos 80% para proteção contra o vírus. Em janeiro, estimou-se que cerca de 92 mil pessoas com menos de um ano de idade na Libéria não tinham recebido nenhuma vacina e estão, portanto, vulneráveis a diversas doenças infantis que são passíveis de prevenção.

As atividades de imunização foram retomadas desde que o número de novos casos de Ebola caiu significativamente na Libéria?
Em Monróvia, a maioria das instalações de saúde foram reabertas e a maioria delas estão aptas a oferecer imunização de rotina. Mas os profissionais de saúde, primeiramente, precisam de garantias antes de administrarem injeções, na medida em que o contato com o sangue é um dos principais riscos de contaminação. Além disso, as pessoas ainda estão com medo de buscar cuidados em instalações médicas. Uma de nossas prioridades é superar a perda da confiança no sistema de saúde, tanto de profissionais da área quanto de pacientes, por meio de treinamentos e atividades de conscientização da comunidade.

Uma publicação recente sugere que um surto de sarampo regional massivo pode ocorrer devido às baixas taxas de cobertura vacinal. Qual a probabilidade de isso acontecer?
Um surto de sarampo foi de fato declarado em janeiro de 2014 em Conacri, na Guiné, pouco antes da epidemia de Ebola começar. No início de março deste ano, equipes de MSF registraram aproximadamente 180 casos de sarampo na capital da Libéria. Além de dados e projeções, é essencial reforçar a vigilância e investigar os casos suspeitos, na medida em que o restabelecimento da cobertura vacinal é urgentemente necessário.

Como MSF está prestando suporte aos casos de sarampo e às atividades de vacinação na Libéria?
Na província de Montserrado, MSF tem prestado suporte a centros de saúde com doações e treinamento em temas como o isolamento e o tratamento de crianças infectadas. Também estamos trabalhando com as autoridades liberianas e parceiros para reforçar a vigilância e o mapeamento da região.

Nos dias 18 e 19 de março, nossas equipes conduziram uma campanha de vacinação de dois dias na Ilha de Peace. Nesse bairro de Monróvia foram reportados os maiores números de casos de sarampo. Quinhentas pessoas com idades entre seis meses e cinco anos foram vacinadas desde então. Protocolos de prevenção da infecção reforçados foram implementados durante essa campanha, incluindo exames para febres sistemáticas e um questionário médico, desinfecção de luvas entre uma injeção e outra, filas de espera menores, entre outras coisas. Nosso objetivo foi também mostrar que é possível vacinar de forma segura em um contexto de Ebola.

Esperamos que as lições aprendidas com essa campanha-piloto possam ajudar na organização de campanhas de vacinação de massa que as autoridades liberianas têm planejadas para maio. Preferencialmente, também imunizaremos crianças contra outras patologias – poliomielite, tétano, difteria e coqueluche, por exemplo – e distribuiremos vitamina A, além de oferecer tratamento preventivo contra a malária, principalmente com a proximidade da estação chuvosa. Até o momento, neste surto, o risco de contaminação por Ebola impossibilitava a vacinação. Esperamos que isso esteja mudando.

Saiba mais sobre a retomada dos serviços públicos de saúde na Libéria aqui.

MSF inaugurou o centro de tratamento de Ebola de ELWA 3 em Monróvia em agosto de 2014 e o Ministério da Saúde vai assumir a instalação no final de março. Um centro de trânsito para pacientes com suspeita de Ebola no Hospital Redenção está em funcionamento desde novembro. O centro de tratamento de Ebola de MSF em Foya foi fechado em dezembro de 2014, após a província de Lofa ter sido oficialmente declarada livre do vírus. Desde o início da epidemia, 670 pacientes sobreviveram ao Ebola nas instalações de MSF a Libéria.

Equipes de resposta rápida de MSF foram recentemente enviadas às províncias de Grand Bassa, Grand Cape Mount e Margibi para ajudar as autoridades de saúde a responder aos surtos locais.

Em outubro de 2014, equipes de MSF distribuíram tratamento preventivo para malária no oeste da capital da Libéria, beneficiando aproximadamente 600 mil pessoas.

Em 21 de março, MSF inaugurou um novo hospital pediátrico para aumentar a capacidade de tratamento emergências médicas não relacionadas com o Ebola em Monróvia. Esse hospital, que funciona 24 horas por dia, sete dias por semana, começou a operar com 46 leitos para crianças com menos de cinco anos de idade, com a possibilidade de ampliar sua capacidade para até 100 leitos.

Compartilhar