Ensaio clínico de MSF influencia novas diretrizes da OMS para tratamento da tuberculose

Tratamento mais curto e efetivo será recomendado para a forma resistente da doença

Foto: Chloe Sharrock

Médicos Sem Fronteiras (MSF) está satisfeita que, após compartilhar os resultados do TB-PRACTECAL, nosso ensaio clínico que encontrou um novo regime de tratamento oral mais seguro e eficaz de seis meses para a tuberculose multirresistente a medicamentos (TB-MDR), a Organização Mundial da Saúde (OMS) anunciou que atualizará suas diretrizes sobre o tratamento global da doença.

Após os resultados do ensaio de MSF, agora a OMS recomenda o uso programático do regime BPaLM de 6 meses – compreendendo bedaquilina, pretomanida, linezolida (600 mg) e moxifloxacina, em pacientes com tuberculose multirresistente em vez de regimes existentes mais longos. A OMS também recomenda outro tratamento mais curto, a combinação de bedaquilina, pretomanida e linezolida, em pacientes com maior resistência a medicamentos, uma vez que ambos os regimes mostraram alto sucesso no tratamento.

TB-PRACTECAL é o primeiro ensaio clínico controlado, aleatório e multinacional sobre eficácia e segurança de um regime totalmente oral de seis meses para tuberculose multirresistente a medicamentos. A pesquisa incluiu 552 pacientes em sete locais em Belarus, África do Sul e Uzbequistão. O ensaio clínico de fase II/III descobriu que o novo regime de tratamento mais curto foi muito eficaz contra a tuberculose multirresistente; 89% dos pacientes no grupo BPaLM foram curados, em comparação com 52% no grupo de tratamento padrão.

“O tratamento mais curto seria muito significante, pois acho que quando se está em tratamento, algumas partes da sua vida parecem que foram colocadas em espera”, disse AwandeNdlovu, que foi inscrito no estudo na Unidade de Ensaios Clínicos THINK Hillcrest na África do Sul.

“Antes que o ensaio me desse esperança, eu não conseguia nem ver o menor sinal de recuperação da tuberculose multirresistente a medicamentos”, completa.

Embora este novo regime forneça novas esperanças para as 500 mil pessoas que adoecem a cada ano com esta forma da doença, o preço global mais baixo atual para um curso desse tratamento de seis meses é de US$ 800 (aproximadamente 4.021 reais). Isso ainda é muito alto e pode retardar a adoção do novo regime em países com alta incidência da doença.

“Os resultados inovadores do TB-PRACTECAL constataram que um regime de seis meses de bedaquilina, pretomanid, linezolida e moxifloxacina (BPaLM) era mais eficaz e mais seguro do que o padrão de cuidados para pessoas afetadas com formas resistentes a medicamentos de TB, mas só veremos mudanças significativas se o tratamento for acessível”, afirma Christophe Perrin, relações institucionais para TB na Campanha de Acesso a medicamentos de MSF.

O medicamento Pretomanid – que foi desenvolvido pela TB Alliance e Viatris (anteriormente Mylan) com a ajuda de financiamento público – custa US$ 336 (cerca de 1.689 reais), por seis meses de tratamento. Além disso, um dos outros novos medicamentos contra a tuberculose, a bedaquilina – (fabricada pela Johnson & Johnson) tem um preço de US$ 270 (aproximadamente 1.357 reais) para o mesmo período de tempo.

Esses dois medicamentos, juntos, representam 3/4 do preço do tratamento completo, apesar de o fato de que pesquisadores da Universidade de Liverpool estimaram que versões genéricas de pretomanida e bedaquilina poderiam ser produzidas e vendidas com lucro por menos de US$ 210 (cerca de 1.055 reais) e menos de US$ 102 (cerca de 512 reais), respectivamente, ambos por seis meses.

“Tendo em conta os significativos fundos públicos que ajudaram a pagar pelo desenvolvimento de pretomanid e bedaquilina, esses medicamentos devem ser acessíveis a todas as pessoas que necessitem. Apelamos a TB Alliance, Viatris e Johnson & Johnson para que diminuam o preço da pretomanida e da bedaquilina para garantir que o valor de um curso completo de tratamento de TB-MDR não seja superior a US$ 500 (aproximadamente 2.513 reais) por pessoa. O preço nunca deve ser uma barreira para acessar um tratamento que salva vidas”, completa Perrin.

“Quando embarcamos nesta jornada há nove anos, os pacientes com tuberculose multirresistente em todo o mundo estavam enfrentando um tratamento longo, ineficaz e exaustivo que prejudicou suas vidas. Os pacientes nos contavam como era difícil aderir ao tratamento, mas pouco progresso estava sendo feito para encontrar tratamentos menos agressivos, uma vez que as doenças mais prevalentes em países de baixa e média renda não atraem investimentos. Por isso, fomos obrigados a buscar novas opções de tratamento”, disse Bern-Thomas Nyang’wa, diretor médico de MSF e coordenador do ensaio-clínico TB-PRACTECAL. “Esses resultados darão aos pacientes, suas famílias e profissionais de saúde em todo o mundo esperança para o futuro do tratamento da tuberculose resistente a medicamentos”.

Saudamos a decisão da OMS de atualizar as diretrizes de tratamento. Agora, é essencial que os programas nacionais de tuberculose, as autoridades de saúde e outras partes interessadas garantam que esse tratamento esteja disponível para pessoas com esta forma da doença o mais rápido possível – Bern-Thomas Nyang’wa, diretor médico de MSF e coordenador do ensaio-clínico TB-PRACTECAL

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