Iêmen: Desafios de suprimentos para COVID-19 geram soluções alternativas de curto prazo

Os desafios enfrentados em meio a um conflito que não dá trégua

Iêmen: Desafios de suprimentos para COVID-19 geram soluções alternativas de curto prazo

O conflito em andamento no Iêmen, que já completa seis anos, dizimou o sistema público de saúde local. O país, que tem apenas metade das instalações médicas ainda funcionando , não consegue mais atender às necessidades das pessoas vulneráveis que mais precisam.

Diferente de outras epidemias que o Iêmen já enfrentou no passado, o novo coronavírus impõe desafios sem precedentes – tanto na restrição de movimento de profissionais de saúde e de suprimentos, como na escassez generalizada de suprimentos, especialmente de equipamentos de proteção individual (EPI), essenciais para profissionais que estão lidando com recursos limitados.

Para reduzir os riscos de contágio e de espalhar a COVID-19, as equipes de MSF têm sido obrigadas a produzir manualmente seus EPIs, usando materiais disponíveis no país. Entretanto, deve-se dizer que se trata de solução incompleta e temporária, porque as máscaras e os aventais de proteção são inadequados para a equipe que está lidando com tarefas médicas básicas, ao passo que estoques perto do fim de materiais primários mostram que esses esforços para responder à escassez de EPIs podem ter vida curta.

O catalisador por trás da produção

“A ideia surgiu em função da escassez de EPIs que estamos vivendo”, diz Annie Marie Morales, líder da equipe médica de MSF em Ma’rib. “Tivemos de achar uma forma de evitar o desperdício dos escassos EPIs para que eles pudessem ser usados pelos profissionais de saúde. Buscamos alternativas seguras para proteger nossa equipe, uma vez que queremos seguir fornecendo assistência médica com segurança a pacientes que vêm chegando às nossas instalações”.

“Quando a COVID-19 começou a se espalhar pelo mundo, começamos a debater ideias de proteger a nossa equipe e os pacientes quando e se o vírus eventualmente chegasse ao país”, diz Armand Dirks, que coordena o projeto de MSF na cidade de Taiz. “As chances de conseguirmos EPIs no Iêmen eram limitadas porque havia escassez em todo o mundo e os suprimentos têm enfrentado restrições de movimentação globalmente. Acabamos decidindo pela produção em Taiz, por fornecedores locais, de materiais não médicos de proteção, que poderíamos doar para hospitais que apoiamos”.

Tempos urgentes exigem medidas urgentes

“Compramos macacões à prova d’água como alternativa aos descartáveis e fizemos um pedido grande de máscaras não médicas no mercado local”, diz Katrin Mielck, coordenadora de projetos de MSF em Taiz-Houban. “Elas são de uso apenas pela nossa equipe não médica e seus familiares, bem como pacientes e cuidadores, mas não funcionariam para nossos médicos e enfermeiros, que precisam de EPIs mais especializados. Também tivemos a ideia de produzir protetores faciais, inspirados no projeto parceiro de MSF em Ma’rib. Eles são muito práticos, por serem reutilizáveis quando desinfetados com cloro e ainda protegem o rosto inteiro de gotículas e fluidos, principais transmissores da COVID-19.”

Annie destaca a necessidade de proteger os profissionais de saúde do contágio por COVID-19 em Ma’rib em em todo o Iêmen neste momento crítico. “Ter recursos de proteção em um momento em que há restrições excepcionais nos permitiu durar um pouco nos esforços de seguir com o nosso dever de cuidar dos nossos pacientes com a equipe devidamente protegida”.  

“Os EPIs são essenciais para todas as nossas atividades diárias, não apenas para impedir o contágio pelo coronavírus”, diz Katrin. “Usamos EPIs em muitas de nossas atividades, como na tenda de operações em que realizamos cerca de 80 cesarianas de emergência por mês.”

“Sabemos que eles funcionam apenas como um pequeno curativo em uma ferida profunda, uma solução paliativa para uma situação complexa”, diz Theresa Berthold, coordenadora de projetos de MSF em Ma’rib. “São uma saída desesperada até que suprimentos adequados possam chegar novamente ao país. Até que isso aconteça. Seguimos enfatizando a importância crucial de lavar as mãos de forma regular e do distanciamento físico como medidas de conter a disseminação do vírus e para manter as comunidades, nossos pacientes e nossa equipe protegidos”.

Produção em massa versus recursos limitados

“Identificamos materiais adequados no mercado local e produzimos itens de proteção usando métodos simples”, diz Christian Hillemeyer, apoio logístico de MSF no projeto em Ma’rib. “Por exemplo, para os protetores faciais, usamos cola e grampeadores. Contratamos costureiros locais para nos ajudar a produzir máscaras não médicas. A produção está em andamento e, até agora, conseguimos produzir 100 protetores e 100 máscaras não médicas. Também arranjamos 10 protetores faciais daqueles de obras 20 pares de óculos de proteção.”

“O conflito de seis anos no Iêmen, os bloqueios sem precedentes devido ao fechamento de fronteiras e a escassez de itens críticos, particularmente EPIs para a proteção da equipe de saúde, fizeram com que as pessoas se tornassem criativas nas suas soluções, por falta de alternativa”, diz Katrin. “Vemos isso em Taiz-Houban, onde o mercado local começou a produzir todo tipo de máscara em uma fase bem inicial da crise da COVID-19. Temos alguns colegas habilidosos na equipe – Adeel, nosso faz-tudo, é um deles. Ele assumiu a tarefa de produzir protetores faciais e uma pia para lavar as mãos acionado pelo pé, inspirado num vídeo de colegas de MSF na África do Sul. Não é preciso tocar com as mãos na torneira, o que faz da solução algo mais higiênico.”

“Para fazer os protetores faciais, Adeel usa folha de acetato usadas normalmente para laminar papel, disponíveis em papelarias”, diz Katrin. “Ele grampeia a folha em uma faixa elástica usada ao redor da cabeça. Temos plena consciência de que essa não é a solução ideal, porque as ferramentas que estamos usamos podem não ser as mais confiáveis. Nossa equipe lida com uma camada extra de dificuldade, além de condições de trabalho que já são desafiadoras e instáveis. Mas estão fazendo o melhor que pode diante dessa escassez extrema de suprimentos essenciais e com altos riscos. Estão determinados a manter o serviço médico funcionando e garantir que os cuidados cheguem aos iemenitas mais vulneráveis.”

Uma situação desconhecida

“Essa é a primeira vez que enfrentamos uma situação assim, uma vez que sempre contamos com suficientes EPIs nos nossos projetos antes”, diz Annie. “Acho que os tomamos como certos, mas agora percebemos sua importância. É uma situação difícil e estamos tentando nos adaptar à medida que as cosias acontecem rapidamente. A transmissão local [de COVID-19] no país coloca em risco as nossas atividades, porque a segurança da nossa equipe e dos pacientes que atendemos é da maior importância.”

“Nunca tive uma situação assim na minha carreira”, diz Katrin. “É preocupante saber que há um surto de COVID-19 no Iêmen, depois de ver até mesmo sistemas altamente desenvolvidos de saúde sendo colapsados pela pandemia. O que tranquiliza é que MSF tem experiência médica para enfrentar esse desafio e faremos todo o possível para proteger nossa equipe e os pacientes. Contudo, para manter nossas atividades médicas, que salvam vidas no país, é crucial que tenhamos EPIs. Se esses itens essenciais acabarem, seremos forçados a fechar nossas instalações de saúde e não poderemos mais atender as pessoas que mais precisam dos nossos serviços, crianças e mulheres grávidas.”  

Embora nossas equipes sigam determinadas a manter essas atividades médicas que salvam vidas, a falta de equipamentos de proteção traz uma ameaça muito real à nossa capacidade de trabalhar. MSF pode ser forçada a interromper esses programas vitais, a menos que EPIs possam ser garantidos em quantidade suficiente para os nossos times no Iêmen.

MSF atuou no Iêmen pela primeira vez em 1986 e tem mantido presença constante no país desde 2007. Administramos programas médicos que salvam vidas em todo o país, atendendo às necessidades do povo iemenita, que tem lutado dia após dia para ter acesso a atendimento médico em meio ao conflito atual.
Atualmente, MSF trabalha em 12 hospitais e centros de saúde em todo o país e presta apoio a mais 20 unidades de saúde em 13 províncias iemenitas.

 

Com o avanço da COVID-19, as necessidades em nossos projetos crescem rapidamente. Seja um doador sem fronteiras e nos ajude a continuar salvando vidas.

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