Líbano: profissional de MSF deslocada pelos ataques relata cenas de caos em Beirute

“Estamos em um lugar seguro, por enquanto”, diz Maryam Srour

Bombardeios ao sul de Beirute. Líbano, 28 de setembro de 2024. © MSF

Maryam Srour é coordenadora de comunicação operacional de Médicos Sem Fronteiras (MSF) em Beirute, no Líbano. No sábado (28/09), enquanto estava em um carro tentando fugir dos ataques na cidade, ela relatou a situação caótica em meio aos bombardeios no sul de Beirute.

“Ontem (27/09), ouvimos e sentimos uma enorme série de explosões enquanto estávamos em reuniões no escritório. Terminamos o trabalho e ficamos presos no engarrafamento. Eu tinha acabado de me mudar para um lugar mais seguro, desde que o bombardeio em torno de Beirute e em todo o país se intensificou, na segunda-feira (23/09). Quando cheguei à minha nova casa, por volta das 22h, meus familiares já haviam se juntado a nós. Eles deixaram suas casas, pensando que seria mais seguro onde estávamos.

Da minha varanda, vi dezenas e dezenas de pessoas andando pelas ruas carregando o que podiam, sacolas plásticas, mochilas ou mesmo nada. As pessoas nos subúrbios do sul de Beirute receberam ordens de evacuação das forças armadas israelenses.

Ouvimos, sentimos e vimos os ataques. Nosso prédio estava tremendo.”
– Maryam Srour, coordenadora de comunicação operacional de MSF em Beirute

Vimos pessoas fugindo a pé – pessoas jovens e com idade avançada. Algumas estavam em carros. Não estávamos no bairro que foi alvo, mas ouvimos drones e aviões. Nós sentimos que eles [as forças israelenses] estavam por perto. De repente, ficou tudo escuro e o bombardeio começou em todos os lugares. Havia uma fumaça densa no ar, e as pessoas nas ruas estavam tossindo. Eu estava com minha mãe, meu irmão e minha irmã, tentando descobrir o que faríamos depois. As estradas estão seguras? Para onde vamos?

Eu tinha acabado de sair da minha casa em Dahieh – subúrbio no sul de Beirute – há alguns dias, por causa dos intensos
bombardeios, e me mudei para este local. Pensamos que estaríamos mais seguros aqui. Agora precisamos sair de novo.

Peguei uma bolsa de itens essenciais que tinha em mãos. Fomos informados de que era melhor levar colchões, então colocamos dois em nosso carro e pegamos um pacote de garrafas de água. Eu não sabia o que fazer. Havia incêndios em todos os lugares após os ataques aéreos, e ouvi uma enorme explosão. Ouvimos, sentimos e vimos os ataques. Nosso prédio estava tremendo. Houve uma enorme explosão em um lugar sem aviso prévio para evacuação.

Estou acostumada a ser uma profissional humanitária, mas agora também sou uma pessoa deslocada por ataques aéreos em meu próprio país.”
– Maryam Srour, coordenadora de comunicação operacional de MSF em Beirute

Cercada por fogo e fumaça, eu estava repetindo para mim mesma: “Tudo o que precisamos é de um plano e agir, um plano e agir; não espere aqui.” Saímos do lugar o mais rápido que pudemos. Não sei o que aconteceu com a minha própria casa, ou com a casa nova. Continuamos ligando e dirigimos por algumas horas antes de descobrir para onde ir. Por volta das 5 horas da manhã, encontramos um lugar do outro lado das montanhas.

Tivemos muita sorte de sair quando saímos, porque os incêndios após os ataques aéreos ainda estavam acontecendo onde estávamos antes. Só precisávamos de um lugar para descansar um pouco, para ver para onde ir depois. Ainda não dormimos. Algumas pessoas ainda estão em carros. Agora estamos assistindo às notícias e vendo as imagens chocantes do que está acontecendo.

Sei que meus colegas, a equipe de MSF, estão em ação, fornecendo água por meio de caminhões para abrigos e escolas em Beirute e no Monte Líbano, onde famílias deslocadas estão abrigadas. Algumas pessoas estão deitadas nas calçadas. MSF conseguiu fornecer 86 mil litros de água em 24 horas e também está distribuindo kits contendo itens básicos de higiene e outros suprimentos, assim como colchões, para as pessoas deslocadas.

Nossas equipes de saúde mental estão nas ruas fornecendo primeiros socorros psicológicos a pessoas que se encontram traumatizadas com a situação e que buscam refúgio nas escolas.

Estou acostumada a ser uma profissional humanitária, mas agora também sou uma pessoa deslocada por ataques aéreos em meu próprio país. Estamos em um lugar seguro, por enquanto.”

 

 

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