Mauritânia: cancelamento da distribuição de alimentos aumenta o risco de desnutrição para refugiados malineses

Mais de 49 mil pessoas deixaram suas casas para fugir da violência e podem ser prejudicadas com o corte de alimentos

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O cancelamento da distribuição mensal de alimentos de julho para 49.500 refugiados malineses no campo de Mbera poderá causar um aumento dos níveis globais de desnutrição aguda, alerta a organização humanitária internacional Médicos Sem Fronteiras (MSF), que oferece cuidados médicos e apoio para tratar a desnutrição no acampamento. MSF pede à comunidade internacional de doadores que garanta o acesso a fontes confiáveis de alimentos aos refugiados no campo de Mbera.

O Programa Alimentar Mundial (PAM), diante da enfrenta escassez de recursos financeiros, não tem conseguido assegurar o financiamento da distribuição geral de alimentos de julho. Além disso, o Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (Acnur), que é responsável pela gestão do acampamento, insiste estar sem fundos para propor uma solução alternativa à consequência inevitável do aumento da desnutrição.

A atual realidade é consequência de uma situação já precária, em que a distribuição de arroz foi cortada de 12 kg para 5,4 kg por pessoa em junho, e a distribuição geral de alimentos foi cancelada por completo em março, o que causou um aumento das admissões de crianças doentes nos programas de nutrição terapêutica de MSF de 30, no mês anterior ao cancelamento, para 79, no mês seguinte ao corte.

“A taxa de desnutrição aguda global no acampamento estava em torno de 20% em 2012, quando iniciamos nossas atividades ali”, disse o Dr. Mahama Gbané, coordenador médico de MSF na Mauritânia. “Trabalhamos junto a agências como o PAM para diminuir essa taxa para estimados 9%. Seria trágico se permitíssemos que a saúde dos mais vulneráveis novamente atingisse níveis catastróficos.”

Esses refugiados escaparam para a Mauritânia em 2012 quando o conflito consumiu o norte do Mali. Apesar dos acordos de paz assinados recentemente por alguns grupos armados de oposição no país, as pessoas ainda não se sentem seguras para voltar para casa. Desde 2012, sua sobrevivência no deserto – onde as temperaturas alcançam os 50ºC e tempestades de areias são comuns – tem dependido largamente da assistência humanitária. Alguns refugiados conseguiram manter seu gado, mas as secas sucessivas têm empobrecido drasticamente o pasto residual para alimentar animais em toda a região do Sahel. Ataques recentes e saques de cidades e vilarejos no norte do Mali aumentaram o receio de que ainda levará um bom tempo até que os refugiados se sintam seguros para voltar à sua terra natal.

“As pessoas tentaram cultivar alimentos nos jardins das comunidades, mas o calor escaldante, as tempestades de areia e insetos destruíram a maioria das plantações”, disse Maya Walet Mohamed, líder do comitê feminino do acampamento. “O momento do intervalo na distribuição de alimentos é ainda mais cruel porque as pessoas já estão jejuando durante o dia para o mês de Ramadan, e agora elas têm poucos alimentos para quebrar o jejum ao pôr do sol.”

Após três anos de seu exílio, a maioria dos refugiados já venderam o pouco que tinham deixado para trocar por fontes alternativas de alimentos, como carne e leite, ou seja, os insumos básicos da dieta tradicional nômade, que não fazem parte das distribuições do PAM. Essa reserva de fonte de alimentos agora está escassa. “Isso é crítico para nós, assim como para a população da Mauritânia, porque os animais estão morrendo ou não servem de nada por causa das secas”, acrescentou Maya Walet Mohamed.

Médicos Sem Fronteiras (MSF) é uma organização internacional médico-humanitária independente que leva ajuda de emergência a pessoas em mais de 60 países afetadas por conflitos armados, epidemias, desastres naturais e exclusão do acesso a cuidados de saúde.

MSF começou a atuar na Mauritânia em 1994. Hoje, 370 profissionais humanitários apoiam o Ministério da Saúde local, oferecendo serviços como cuidados de saúde primária, cirurgias de emergência e cuidados de saúde sexual e reprodutiva na região sudeste do país, incluindo o campo de refugiados de Mbera, em Bassikounou e em Fassala.

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