“Minha filha está desaparecendo diante dos meus olhos”

Pessoas deslocadas pela guerra no Líbano compartilham relatos de sobrevivência em meio aos ataques

Khadija, deslocada no Líbano, com três de seus filhos. Outubro de 2024. © Dalia Khamissy

Em meio aos bombardeios e incursões israelenses em andamento no sul do Líbano, inúmeras famílias foram forçadas a fugir, muitas buscando refúgio em Saida, uma cidade costeira. As equipes das clínicas móveis de Médicos Sem Fronteiras (MSF) têm visitado vários locais na cidade, oferecendo cuidados de saúde básicos, medicamentos e suporte de saúde mental para as pessoas deslocadas pela guerra.

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Aqui, reunimos alguns dos depoimentos compartilhamos por nossos pacientes:

Khadija com seus filhos no estacionamento onde eles buscaram refúgio no Líbano. Outubro de 2024. © Dalia Khamissy

[Minha filha] está desaparecendo diante dos meus olhos.

– Khadija 

Khadija, uma refugiada síria e mãe de cinco filhos, foi deslocada de Nabatieh com sua família. “Ela [minha filha] está desaparecendo diante dos meus olhos”, diz, apontando para a menina de 7 anos de idade que, segundo ela, tem um crescimento atrofiado.

Khadija descreve as difíceis condições no estacionamento onde ela e a família estavam se abrigando em Saida. “ As pessoas estão competindo por comida aqui, e não temos água limpa suficiente para nos lavar. Vamos ao mar para nos aliviar, mas geralmente há homens por perto.”

Seus filhos enfrentam vários problemas de saúde, e isso parte o coração de Khadija. “Sidra, de 13 anos, tem asma. Hiba, de 7 anos, pesa apenas 10 quilos. E Malak, meu filho de 8 meses, tem febre e diarreia. Eu o amamento sempre, mas nem sempre é o suficiente, e não consigo limpar suas mamadeiras corretamente.”

Em um momento de desespero, Khadija admite: “Às vezes, penso que preferia que tivéssemos ficado e morrido em um ataque aéreo em vez de viver assim.”

Hassan em atendimento médico. Outubro de 2024. © Dalia Khamissy

Não há nada como viver em sua própria casa.”

– Hassan Zeineddine

“Não há nada como viver em sua própria casa”, reflete Hassan Zeineddine, 67 anos de idade, libanês deslocado pela guerra. Ele e sua esposa fugiram de Kfar Melki, no sul do Líbano, após os bombardeios israelenses na região. Levaram somente as roupas do corpo. “Meus filhos também estão deslocados, espalhados pelo país. Isso por si só já é uma luta, mas estamos passando pelo mesmo que outras pessoas”, diz.

Hassan já foi deslocado três vezes durante as recentes escaladas da guerra. Ele, aposentado, perdeu sua pensão e suas economias na crise econômica de 2020. Hassan fala com pesar de sua colheita e da profunda conexão com a terra que foi forçado a deixar para trás. “Não há nada como o Sul. Aonde quer que formos, o que quer que percamos e o que quer que nos seja oferecido, sempre voltaremos para o Sul. Vivi a invasão israelense de 1982 e me lembro dos ataques aéreos em vilarejos do Sul. Assim como voltamos para nossas casas naquela época, voltaremos agora.”

Hala com o marido e os filhos. Outubro de 2024. © Dalia Khamissy

Saímos sem nada. Fugimos em uma motocicleta.

– Hala 

Hala, 24 anos, é uma refugiada síria e mãe de três filhos—Yamen, 2, Rawan, 3, e Razan, 6. Ela fugiu da cidade costeira de Adloun, no sul do Líbano, em meio a ataques aéreos e sirenes de ambulâncias. “Saímos sem nada. Fugimos em uma motocicleta, mas ela quebrou aqui em Saida. Meu marido voltou para recuperar nossos pertences, mas tudo foi roubado.”

Agora, eles dependem de ajuda para alimentação. “Todos os meus filhos estão doentes, vomitando e com diarreia. Rawan, que tem síndrome de Down, costumava fazer fisioterapia para caminhar e se movimentar. Tínhamos grandes esperanças de que ela começaria a se comunicar verbalmente em breve, por causa da terapia. Ela havia feito muito progresso. Agora, tudo isso se foi. Ela precisa de muitos medicamentos e é frequentemente intimidada por outras crianças por ter dificuldades em se expressar.”

Shams, Kazem e Marimar com os gatinhos. Outubro de 2024. © Dalia Khamissy

Estou tão aliviada que conseguimos voltar para buscar os gatinhos.” 

– Marimar

Shams Al Mahmoud, cujo primeiro nome significa “sol” em árabe, é uma refugiada síria que permanece radiante e calorosa, apesar das dificuldades que ela e sua família têm enfrentado. Junto com seus filhos—Mimar, 24, Kazem, 20, e Marimar, 14—Shams foi deslocada de Kfar Roumane e agora mora em um estacionamento em Saida, no sul do Líbano.

Sustentando um sorriso cativante, ela relata os momentos em que sua família escapou dos ataques aéreos israelenses na cidade que eles chamaram de lar por mais de uma década. Eles enfrentaram uma fuga de 12 horas a pé, até finalmente encontrar relativa segurança em Saida.

Alguns dias depois, o filho de Shams, Kazem, e uma das filhas, Marimar, fizeram uma perigosa viagem de volta para sua antiga casa, em uma motocicleta emprestada, para resgatar seus dois gatinhos, Simba e Mimi. “Pensamos neles enquanto estávamos saindo,” conta Marimar, enquanto acaricia carinhosamente um dos animais. “Mas os ataques aéreos estavam muito próximos. Estou tão aliviada que conseguimos voltar para buscá-los.”

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