Moçambique: MSF conclui resposta emergencial de três meses após o Ciclone Chido

O ciclone deixou pelo menos 120 pessoas mortas na província de Cabo Delgado e, no distrito de Mecufi, 99% das casas foram destruídas

Jasse Albano, profissional de MSF, realiza teste de malária em uma tenda de atendimento pediátrico no centro de saúde de Nanlia. Fevereiro de 2025 ©Marília Gurgel/MSF

Quando o Ciclone Chido atingiu a província de Cabo Delgado, no norte de Moçambique, em 15 de dezembro de 2024, ventos extremos e inundações causaram destruição generalizada, levando Médicos Sem Fronteiras (MSF) a lançar uma resposta emergencial. Três meses depois, analisamos o impacto do ciclone na vida das pessoas e nos serviços de saúde da região, já fragilizados após sete anos de conflito.

Centro de saúde no distrito de Mecufi, em Moçambique, teve o telhado arrancado na passagem do Ciclone Chido. Dezembro de 2024 ©Marília Gurgel/MSF

Mortes e destruição

O Ciclone Chido trouxe condições climáticas severas ao norte de Moçambique, matando pelo menos 120 pessoas e ferindo 898. Segundo as autoridades locais, quase 700 mil pessoas foram afetadas pelo ciclone — a maioria delas na província de Cabo Delgado e o restante nas províncias vizinhas de Nampula e Niassa.

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De acordo com dados oficiais, no distrito de Mecufi, em Cabo Delgado, 99% das casas foram destruídas. Os distritos de Metuge e Chiúre também registraram níveis críticos de danos.
As equipes de MSF, que já atuavam em Cabo Delgado em resposta ao conflito em curso, lançaram uma operação emergencial no final de dezembro.

Imagem do interior do centro de saúde de Murrebue, em Mecufi, após o ciclone. Dezembro de 2024 ©Marília Gurgel/MSF

Trauma psicológico

Embora eventos climáticos extremos, como ciclones, estejam se tornando mais frequentes e intensos em Moçambique, a maioria das pessoas em Cabo Delgado nunca havia vivenciado algo parecido. O Ciclone Kenneth passou pela província em 2019, mas seu impacto foi muito menos severo em comparação com a devastação na província de Sofala. Milhares de pessoas ficaram traumatizadas com a perda de familiares, casas e meios de subsistência.

Um dos principais focos da resposta de MSF foi ajudar as pessoas a acessar cuidados psicológicos emergenciais. As equipes de MSF treinaram funcionários do Ministério da Saúde e agentes comunitários de saúde para fornecer primeiros socorros psicológicos e aconselhamento. Também ofereceram 320 sessões individuais de aconselhamento e prestaram apoio psicológico em grupo a 4.962 pessoas em diversas localidades dos distritos de Mecufi e Metuge.

Teodoro Vicente, promotor de saúde de MSF, explica como reconhecer problemas de saúde mental e como acessar cuidados de saúde. Fevereiro de 2025 ©Marília Gurgel/MSF

“No pós-ciclone, presenciamos um cenário devastador, onde milhares de pessoas lutavam para dormir e sobretudo para reconstruir suas vidas”, afirma Ana Mafalda, coordenadora de atividades de enfermagem de MSF.

“O trauma era generalizado. A maioria das pessoas nunca havia passado por uma consulta psicológica e não compreendia que muitos de seus sentimentos tinham origem psicológica. Diante das enormes necessidades, nossas equipes redobraram os esforços para oferecer aconselhamento psicológico em larga escala, adaptado à realidade dessas pessoas.”

Sistema de saúde fragilizado

Mesmo antes do Ciclone Chido, muitas pessoas na província de Cabo Delgado já enfrentavam a insegurança alimentar. A situação se agravou com a destruição de milhares de hectares de plantações e dos estoques de alimentos nas casas. O clima extremo também danificou o sistema de água e saneamento da província, destruiu duas unidades de saúde e danificou parcialmente outras oito.

Equipe de MSF avalia paciente para desnutrição. Fevereiro de 2025 ©Marília Gurgel/MSF

As equipes de MSF concentraram-se em manter os serviços médicos essenciais em funcionamento em dois dos principais centros de saúde da província, nos distritos de Mecufi e Metuge, onde está localizado o centro de saúde de Nanlia. Entre 24 de dezembro e 7 de fevereiro, as equipes de MSF realizaram 6.847 consultas médicas gerais e ajudaram no parto de 73 bebês. A maioria das consultas foi relacionada a malária e doenças diarreicas, ligadas às inundações e à falta de água potável.

Entre 24 de dezembro e 7 de fevereiro, as equipes de MSF realizaram 6.847 consultas médicas gerais em Mecufi e Metuge. Fevereiro de 2025 ©Marília Gurgel/MSF

Nos últimos três meses, os engenheiros de água e saneamento de MSF trabalharam no fornecimento de 85 mil litros de água potável. Eles também repararam cinco blocos de latrinas, instalaram três banheiros emergenciais e 15 plataformas para lavagem das mãos nos dois centros de saúde. A equipe de MSF distribuiu 200 redes mosquiteiras para gestantes, protegendo-as da malária, transmitida por mosquitos que se proliferam em águas paradas.

Em ambos os centros de saúde de Mecufi e Nanlia, nossa equipe de logística consertou os telhados da maternidade, da sala de consultas e da área de vacinação, garantindo o acesso contínuo da comunidade à saúde. Também doaram medicamentos e suprimentos médicos aos dois centros de saúde reabilitados.

Resposta humanitária insuficiente diante das necessidades

Após sete anos de conflito em Cabo Delgado, milhares de pessoas foram deslocadas de suas casas e vivem em abrigos improvisados feitos de galhos e palha. Abrigos em 10 acampamentos para deslocados foram completamente destruídos pelos ventos fortes, deixando muitas pessoas já vulneráveis sem casa e sem recursos. Muitas ainda enfrentam a falta desesperadora de comida e água potável, enquanto as organizações humanitárias tentam suprir as necessidades.

“As pessoas na província de Cabo Delgado estão começando a árdua tarefa de reconstruir suas vidas, mas é evidente que o impacto físico e mental do ciclone persistirá por um bom tempo”, diz Ana Mafalda. “Embora a fase de emergência tenha acabado, é essencial continuar canalizando ajuda humanitária para as vítimas do ciclone, permitindo que reconstruam suas vidas de forma mais resiliente e digna”, conclui ela.

No dia 10 de março, Moçambique foi atingido pelo Ciclone Jude, afetando principalmente a província de Nampula. As equipes de MSF estão atualmente avaliando a situação para determinar a necessidade de uma nova intervenção emergencial.

 

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