Moçambique: MSF responde a surto de cólera após o ciclone Freddy

Na Zambézia, foram registrados 350 novos casos de cólera em apenas 24 horas.

Centro de tratamento de cólera em Quelimane, capital da Zambézia. Foto: Martim Gray Pereira/MSF

Médicos Sem Fronteiras (MSF) está prestando apoio às autoridades de saúde na província da Zambézia, no centro de Moçambique, em resposta ao surto de cólera causado pelo impacto do ciclone Freddy, que atingiu o país em março. De acordo com as Organização das Nações Unidas (ONU), o ciclone afetou cerca de 1,2 milhão de pessoas em Moçambique, das quais 750.000 estavam na Zambézia. Em 16 de março, as autoridades locais declararam um surto de cólera na província, quando foram registados cerca de 350 novos casos em apenas 24 horas.

Além da destruição e do desalojamento de milhares de pessoas, o ciclone contribuiu para um número crescente de casos de cólera na Zambézia, por causa da destruição de infraestruturas de abastecimento de água. Ao todo, também foram destruídas 123 instalações de saúde, acrescentando desafios significativos ao acesso a serviços médicos na província.

Área atingida pelo ciclone Freddy em Quelimane. Foto: Martim Gray Pereira/MSF

A cólera é causada por uma infecção bacteriana do intestino, transmitida por meio de alimentos ou água contaminada ou por meio de contato com o vômito ou fezes de pessoas infectadas. A doença pode causar forte diarreia e vômitos, e pode ser fatal em algumas horas se não for tratada rapidamente.

Na segunda quinzena de março, o Ministério da Saúde de Moçambique registou cerca de 8.000 casos acumulados de cólera na Zambézia. Destes, 3.100 pessoas tinham sido sido internadas e recebido apoio em instalações de saúde. Também foram reportadas dezenas de mortes devido à cólera na província.

Zura Caetano, de 27 anos de idade, moradora de Quelimane, capital da província, acompanhou o sobrinho a um centro de tratamento de cólera. “Quando o meu sobrinho chegou aqui, estava muito doente. Mas agora, após o tratamento, se sente melhor. Em breve, iremos para casa, já que ele terá alta nesta manhã”, disse Zura. “Muitas pessoas perderam tudo o que tinham por causa do ciclone Freddy. Muitas perderam as suas casas e estão tentando reconstruí-las”, acrescentou.

“Nunca vi nada assim desde que nasci. Ainda tenho medo. Nas últimas duas semanas, não tem tido água nem eletricidade na cidade. As pessoas estão buscando água em poços, e aqueles que não a fervem estão ficando doentes com cólera”.
– Zura Caetano, moradora de Quelimane.

No dia 16 de março, quando o surto foi declarado em Quelimane, havia apenas um Centro de Tratamento de Cólera (CTC), com capacidade de 17 camas. Para responder às necessidades, as equipes de MSF se deslocaram para a cidade, para apoiar os serviços de saúde na região. Em uma semana, MSF ampliou a capacidade do CTC para 49 camas e estabeleceu um novo centro de tratamento com 190 leitos. MSF também estabeleceu duas Unidades de Tratamento de Cólera (UTC) menores, com cerca de 15 camas cada, nos bairros de Icidua e Mecajune. Atualmente, esses centros de tratamento têm uma capacidade conjunta para internação de 269 pacientes. Nos primeiros dias, os centros atingiram rapidamente a capacidade total.

Leia também: MSF conclui resposta ao cólera no Niassa, em Moçambique

Nas instalações de tratamento da cólera, MSF está atuando em conjunto com as autoridades locais de saúde e prestando apoio na gestão de casos de pacientes, formação de pessoal médico e não médico, recrutamento de profissionais de apoio e doação de equipamento médico e de medicamentos. Essas doações incluem 150 camas para pacientes com cólera, 1.000 doses de antibióticos, 10.000 litros de lactato de Ringer* para reidratação intravenosa de pacientes em situação grave e 80.000 doses de sais de reidratação oral. MSF também está envolvida em atividades de promoção da saúde, incluindo a disseminação de mensagens-chave de prevenção e resposta à cólera na rádio, em idiomas locais, e a produção de materiais de sensibilização. No total, cerca de 11.000 folhetos e cartazes estão sendo distribuídos por toda a cidade de Quelimane.

Moradores de Quelimane trabalham na recontrução de casas após o ciclone Freddy. Foto: Martim Gray Pereira/MSF

Desafios na resposta ao surto de cólera

Os principais desafios na resposta à cólera na Zambézia estão relacionados com o acesso à água potável, higiene e saneamento. No final de março, ainda não havia água corrente em Quelimane, uma cidade com cerca de 420.000 habitantes – o que causa constrangimentos significativos no que diz respeito às necessidades básicas, incluindo higiene. Existe uma necessidade urgente de avaliar e tratar as fontes de água em Quelimane, tendo em vista que a água é uma das principais fontes de contaminação. O restabelecimento dos serviços de abastecimento de água deve ser complementado com fortes atividades de envolvimento comunitário para aumentar a sensibilização sobre a importância de tratar a água para prevenir a cólera.

No dia 30 de março, as autoridades de saúde lançaram uma campanha de vacinação contra a cólera dirigida a mais de 410.000 pessoas na Zambézia. No total, o Ministério da Saúde de Moçambique encomendou mais de dois milhões de vacinas contra a cólera para serem administradas por todo o país no decorrer de 2023.

De 14 de setembro de 2022 a 1º de Abril de 2023, foram reportados cerca de 22.500 casos de cólera e 100 mortes em Moçambique, segundo o Ministério da Saúde. Nos últimos meses, MSF tem prestado apoio aos serviços de saúde na resposta e prevenção à cólera nas províncias de Cabo Delgado, Manica, Maputo, Nampula, Niassa, Sofala, Tete, e Zambézia.

 

* Lactato de Ringer é uma substância administrada em pacientes com desidratação grave, que fornece quantidades adequadas de sódio e cálcio.

Compartilhar