MSF amplia oferta de cuidados de saúde com qualidade no território Yanomami

Presente na região de Auaris desde maio de 2023, organização atua em parceria com autoridades de saúde no combate à malária

Equipe de MSF chegando a comunidade na região de Auaris. ©Diego Baravelli/MSF

A cena na chegada da equipe de Médicos Sem Fronteiras (MSF) à comunidade de Kolulu, na Terra Indígena Yanomami (TIY), é de movimentação e alegria. Várias pessoas esperam na beira do rio e observam atentas mais um desembarque dos profissionais depois da viagem de barco.

Neste dia, a equipe de MSF realizou uma atividade médica de rotina e prevenção de doenças comuns na região, como malária, diarreia e tungíase (uma parasitose que atinge a pele). Os pacientes – a maioria mulheres, crianças e bebês – fizeram uma fila ao ar livre para o atendimento.

O solo irregular desafiava as profissionais, que tiveram dificuldade para manter a balança alinhada. Elas improvisaram, colocando-a sobre uma mesa. E o que era um pequeno problema acabou fazendo a alegria das crianças, que se divertiram ao serem carregadas para serem pesadas.

MSF promove atendimentos de saúde primária, saúde mental e promoção de saúde. ©Diego Baravelli/MSF

A ação de MSF na região de Auaris engloba a oferta de saúde primária, como na atividade em Kolulu, mas está focada principalmente no combate à malária – uma atividade na qual a organização acumula décadas de experiência. Segundo dados do Ministério da Saúde, o Polo Base, principal instalação de saúde de Auaris, registrou o maior número de casos da doença (1.622) na TYI durante o primeiro trimestre de 2024. O cenário é muito desafiador, mas comparado ao mesmo período de 2023, houve uma redução de 26% na detecção da doença, quando 2.192 testes tiveram resultado positivo.

MSF promove atendimentos de saúde primária, saúde mental e promoção de saúde. ©Diego Baravelli/MSF

O Polo Base atende os quase cinco mil habitantes das comunidades Sanöma e Ye´kwana da região de Auaris, área mais densamente povoada de todo o território Yanomami. Somente entre janeiro e julho deste ano, quase oito mil atendimentos foram realizados no polo. Também em parceria com o DSEI-YY, que colaborou com transporte aéreo dos materiais, entre outras ações, MSF coordenou a reforma e ampliação do local, com investimento de 400 mil euros, cerca de 2,5 milhões de reais. O objetivo é que a estrutura renovada contribua para o tratamento da malária e o atendimento de saúde em geral com mais qualidade, no território, tentando reduzir o número de remoções para Boa Vista sempre que possível.

Ação de busca ativa de malária no território indígena. ©Diego Baravelli/MSF

Para combater a malária, profissionais de MSF e do DSEI-YY realizam visitas domiciliares para a busca ativa por meio do método gota espessa, cujo diagnóstico é feito por microscopistas em Auaris. Se o resultado for positivo, o tratamento é iniciado imediatamente. “Nosso intuito é chegar ao maior número de pessoas possível, mesmo em áreas de difícil acesso, por isso já estivemos na maioria das comunidades da região”, conta Caterina Galliziolli, coordenadora médica.

Em Auaris, MSF atua com uma equipe multidisciplinar, composta por cerca de 20 profissionais de diversas áreas, tais como: médicos, psicólogos, enfermeiros, microscopistas, promotores de saúde, antropólogos e mediadores interculturais.

A malária é considerada pelas populações locais como um tipo de xawara, doença causada por não indígenas e tratada por médicos convencionais, não pelos tradicionais pajés. “Apesar de ser endêmica em toda região amazônica, a doença pode ser prevenida e tratada com eficácia, razão pela qual a conscientização é fundamental para diminuir os índices de contágio”, explica Galliziolli.

Com este objetivo, nossos promotores de saúde e mediadores interculturais realizam sessões informativas nas comunidades da região. Infelizmente, mesmo com o trabalho das equipes médicas e de promoção de saúde ainda há alguns casos de óbito decorrentes da doença, o que ocasiona um profundo luto coletivo nas comunidades.

Foi esse o cenário com o qual se deparou a equipe de MSF ao retornar ao Polo Base depois da visita a Kolulu. Uma criança de dois anos, recém-chegada à unidade de saúde já em estado grave, havia falecido por causa da malária. A tristeza tomou conta da população e dos profissionais e alterou o ambiente normalmente movimentado e repleto de vozes em diferentes idiomas. Foi inevitável não pensar que, horas antes, outras crianças se divertiam durante as atividades médicas em Kolulu. Da mesma forma que a alegria havia sido vivenciada de maneira coletiva, ela agora dava lugar ao luto, também coletivo.

“Temos trabalhado o luto com essa perspectiva em atividades em grupo e individuais. Acredito que as pessoas daqui entendem a saúde como bem viver, uma noção relacionada à vida em comunidade, à floresta, à natureza. Tudo que é vivo é parte do coletivo, da comunidade. Se alguém ou algo neste contexto está mal, afeta a todos. Por isso, valorizamos e promovemos esse olhar integral e de apoio psicossocial, buscando contribuir com o bem viver das comunidades”, relata a psicóloga de MSF Deborah Gonçalves.

Médicos Sem Fronteiras (MSF) iniciou suas atividades no Brasil na década de 1990, trabalhando durante uma epidemia de cólera que impactou comunidades indígenas e ribeirinhas na região amazônica. Em 1993, a organização chegou a Roraima, em seu segundo projeto no país, para responder a um surto de malária que afetava comunidades das etnias Yanomami e Macuxi. MSF levou cuidados de saúde às comunidades afetadas e treinou trabalhadores de saúde, incluindo microscopistas e agentes indígenas de saúde.

 

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