MSF condena assassinato de profissionais do sexo em Beira e apela por segurança

Duas profissionais do sexo atendidas por projeto comunitário de MSF foram mortas, aumentando o medo e as barreiras no acesso à saúde.

Foto: Giuseppe La Rosa/MSF
Foto: Giuseppe La Rosa/MSF

Após uma série de assassinatos brutais aparentemente direcionados a mulheres na cidade de Beira, Moçambique, a organização médico-humanitária Médicos Sem Fronteiras (MSF) expressa choque e alarme pelo assassinato de duas profissionais do sexo que faziam parte do programa comunitário da organização. O projeto atende populações-chave, que incluem profissionais do sexo, homens que fazem sexo com homens e jovens em risco, que muitas vezes são isolados, criminalizados ou submetidos a estigma, discriminação e violência.

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Estamos indignados com os assassinatos aparentemente direcionados a mulheres em situação de extrema vulnerabilidade”.

– Jessie Ashay Kurnurkar, coordenadora do projeto de MSF em Beira.

“Duas profissionais do sexo atendidas por MSF foram assassinadas em questão de semanas. Seus pares as identificaram como uma profissional do sexo migrante de 32 anos do Zimbábue, que deixa uma filha de quatro anos, e uma profissional do sexo moçambicana de 22 anos, que deixa três filhas e um filho”, diz Jessie Ashay Kurnurkar, coordenadora do projeto de MSF em Beira.

“Às vésperas da iniciativa ‘16 Dias de Ativismo Contra a Violência Sexual e Baseada em Gênero (VSBG)’ e do ‘Dia Internacional para Acabar com a Violência Contra as Profissionais do Sexo’, apelamos pelo fim da violência e uma maior proteção para as profissionais do sexo”, acrescenta.

A polícia moçambicana está investigando a série de assassinatos em várias áreas de Beira desde setembro de 2022, mas o medo ainda atinge as comunidades de profissionais do sexo na cidade portuária.

“Não estamos vivendo livremente”

– Maria*, uma profissional do sexo que mora em Beira.

“Não estamos mais saindo de nossas casas. Quando saímos, tentamos caminhar em grupos. À noite, não estamos abrindo nossas portas para os clientes porque estamos com medo, então estamos perdendo trabalho. Como vamos conseguir pagar as contas? Como vamos pagar o aluguel? Estamos traumatizadas. Minha colega que foi assassinada deixou três filhas”, diz Maria*, uma profissional do sexo que mora em Beira.

Após os assassinatos, além das atividades regulares do projeto em Beira, as equipes de MSF intensificaram as atividades de promoção da saúde e os treinamentos sobre prevenção e cuidados relacionados a VSBG para profissionais do sexo e estão trabalhando com as autoridades locais, principalmente a polícia, e organizações sem fins lucrativos e da sociedade civil em Beira. Os maiores esforços incluem atividades de conscientização em parceria com empresários e rádios locais.

Por meio do trabalho médico-humanitário de MSF na África Austral sobre HIV/TB, VSBG e migração, nossas equipes testemunharam a intensa e crônica vulnerabilidade de mulheres, homens e pessoas transgêneros envolvidos no trabalho sexual.

Em Moçambique, África do Sul, Malawi e Zimbabwe, nossas equipes viram como esses grupos enfrentam extrema violência e exploração precisamente porque sobrevivem às margens, especialmente se forem migrantes. Enquanto o trabalho sexual permanecer criminalizado e estigmatizado, centenas de milhares de profissionais do sexo, meninas e mulheres em situação de vulnerabilidade na África Austral continuam em grande risco para a sua saúde física e mental.

“Assim como outros grupos altamente estigmatizados na sociedade, profissionais do sexo evitam principalmente se tornar visíveis para as autoridades e muitas vezes atrasam ou evitam os serviços de saúde devido ao medo de serem detectados, segmentados e rejeitados”, explica Lucy O’Connell, enfermeira de saúde sexual e reprodutiva e conselheira de populações-chave na Unidade Médica da África Austral de MSF.

“Vimos como suas doenças evitáveis e tratáveis correm o risco de se tornar mais complexas e perigosas por causa dessa realidade cruel. Sabemos que as profissionais do sexo não relatam VSBG ou procuram tratamento após a violência por medo de sofrer novamente”, completa.

Pacientes que sofrem VSBG precisam de cuidados médicos dentro de 72 horas da ocorrência, a fim de evitar gravidezes indesejadas, possível infecção pelo HIV e obter aconselhamento em saúde mental. Além disso, pacientes com HIV que demoram a procurar atendimento correm o risco de deteriorar a saúde e apresentam maior risco de transmissão comunitária. Profissionais do sexo e mulheres em situação de vulnerabilidade precisam ter espaços seguros para procurar cuidados de saúde, relatar casos de VSBG e se libertar da violência estrutural.

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