Muito mais do que uma carta: a história do rapaz que perdeu seus pais e sua herança em Gâmbia

Golleh agradeceu os cuidados que recebeu de MSF depois de cruzar o Mediterrâneo

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A organização humanitária internacional Médicos Sem Fronteiras (MSF) está atuando no primeiro centro de recepção de Pozzallo, na província de Ragusa, na Sícila, em parceria com o Ministério da Saúde, para oferecer suporte médico a imigrantes, refugiados e requerentes de asilo. Eles recebem assistência assim que chegam e também durante sua estadia no centro. Muitas vezes, essas pessoas chegam à Europa em más condições de saúde física e mental depois de arriscarem suas vidas cruzando o Mar Mediterrâneo para fugir da pobreza e da violência em seus países.

Um desses sobreviventes é Golleh, de 20 anos, que veio da Gâmbia. Ele chegou ao porto de Pozzalo, na Sícilia, em um barco vindo da Líbia. Golleh estava sentindo dores graves no abdômen, e a médica de MSF, Anna, que o examinou assim que ele desembarcou, diagnosticou uma infecção intestinal que estava sem tratamento há alguns meses. Depois de um curso de antibióticos, Golleh se sentiu muito melhor, e, no momento em que deixou o centro de recepção para dar lugar a outros imigrantes recém-chegados, estava completamente curado.

Mas algumas cicatrizes deixaram marcas não no corpo, mas na mente. É trabalho de Pina e Gaia, duas psicólogas de MSF trabalhando na província de Ragusa, na Sicília, oferecer apoio à saúde mental dos imigrantes que lutam para encarar suas experiências, muitas vezes, traumáticas.

Gaia conheceu Golleh no centro de recepção onde ele estava abrigado enquanto esperava seu pedido de asilo ser processado. Aliviado ao vê-la novamente, Golleh disse à Gaia porque ele estava lá, e o que havia acontecido no caminho.

Há quatro anos, na Gâmbia, os pais adotivos de Golleh morreram. Privado de sua herança, vivendo na pobreza e completamente sozinho, Golleh decidiu ir embora.

Ele, então, passou cinco meses no Senegal e um ano na Mauritânia antes de ir à Líbia. Sem condições de pagar 500 dinares líbios, ele foi preso e forçado a trabalhar todos os dias por dois meses sob ameaças, para pagar sua “dívida”. “Eles me verificavam todos os dias, apontando suas armas para mim, e me bateram”, diz Golleh. Quando foi solto, ele decidiu pegar um barco até a Itália.

“Desde 2011, quando meu pai morreu, as primeiras pessoas que cuidaram de mim foram vocês”, ele contou a Gaia. Nesse dia, Golleh sentou-se e escreveu uma carta para a médica de MSF que o havia tratado quando ele chegou pela primeira vez em Pozzallo:

Oi Anna, eu queria agradecer a você e a todas as pessoas em Pozzallo – os médicos, em particular. Eu envio minhas saudações a todos vocês, porque hoje eu fiquei muito feliz ao ver a tia Gaia, que veio de Pozzallo para nos fazer uma visita aqui no centro. Eu estou muito feliz, e estou escrevendo essa carta para saudar cada um de vocês. Eu vi o respeito que vocês demonstraram aos seres humanos. Vocês dão a cura certa para aqueles que estão doentes. Vocês sempre sorriem porque querem que nos sintamos bem. Por essa razão, eu quero agradecer e orar por vocês.

Seu amigo da Gâmbia,

Golleh

Obrigado por ler a minha carta!”

 

E a resposta de Anna?

“Obrigada a você, Golleh, por escrever a carta! Quando você fez sua longa jornada para escapar da pobreza e da perseguição, quando você foi submetido ao trabalho forçado em uma prisão líbia, quando você arriscou sua vida cruzando o Mediterrâneo, o mínimo que podemos fazer é ajudar a curar suas feridas visíveis e invisíveis.”

 

 

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