Nigéria, MSF: estado de Zamfara é dominado por crise humanitária enquanto violência aumenta

Nigéria, MSF: estado de Zamfara é dominado por crise humanitária enquanto violência aumenta

Abuja, 3 de junho de 2021 – O aumento da violência no estado de Zamfara, noroeste da Nigéria, está causando uma crise humanitária, afirma a organização médica internacional Médicos Sem Fronteiras (MSF). MSF está pedindo uma resposta humanitária urgente para as pessoas da região, que precisam desesperadamente de alimentos, água potável, abrigo, proteção e serviços básicos, incluindo saúde.
 
“Nossas equipes no estado de Zamfara testemunharam um aumento alarmante de doenças evitáveis associadas à falta de comida, água potável, abrigo e vacinas”, disse o dr. Godwin Emudanohwo de MSF, sobre o hospital que a organização apoia na cidade de Anka. “As crianças continuam chegando aqui em péssimas condições. Nos primeiros quatro meses de 2021, nossas equipes em Anka, Zurmi e Shinkafi trataram 10.300 crianças com desnutrição aguda grave, sarampo, malária, diarreia aquosa e infecções respiratórias. Isso representa um aumento de 54% em relação ao mesmo período do ano passado”.
 
O que começou como confrontos ocasionais entre fazendeiros e pastores competindo por terras e recursos hídricos cada vez mais escassos, evoluiu para uma violência generalizada produzida por grupos armados, que usam o sequestro e o saque como fontes lucrativas de renda.

Pessoas que chegam aos centros de saúde de MSF relatam que o aumento da violência os levou a fugir de suas casas, fazendas e áreas de pastagens. Alguns buscaram proteção em cidades maiores de Zamfara, como Anka, onde estão se abrigando em acampamentos formais e informais. As condições de vida nesses locais são terríveis, sem distribuição regular de alimentos ou abrigo adequado, além de fornecimentos de água e saneamento insuficientes, de acordo com as equipes de MSF. Outras pessoas permaneceram em vilarejos, com muito medo de viajar em estradas inseguras, atrasando suas viagens para procurar atendimento médico ou demais necessidades básicas.

‘Quase não há comida’
 
“Quase não há comida para dar aos meus filhos”, diz Halima, que tem dois de seus filhos com desnutrição aguda grave sendo tratados por MSF no hospital de Anka. “Não podemos mais cultivar porque os criminosos atacam nossas fazendas. Dois filhos meus contraíram sarampo e estavam ficando muito magros. As estradas são muito perigosas, mas tive que arriscar nossas vidas e levá-los ao hospital. Da última vez, quando a mais velha pegou sarampo, acabei decidindo tarde demais viajar e trazê-la até o hospital. Ela teve complicações e agora está cega”.
 
Em fevereiro de 2021, havia mais de 124 mil pessoas deslocadas vivendo no estado de Zamfara, de acordo com a Organização Internacional para as Migrações (OIM) – um aumento de mais de 12 mil desde agosto de 2020. Somente na cidade de Anka, as equipes de MSF contabilizaram mais de 14 mil deslocados, com cerca de 1.599 chegadas nos últimos quatro meses.
 
“Tivemos que fugir de nossas áreas de pastagens e a maior parte do nosso gado foi roubada”, diz Nana, que está se abrigando em um acampamento para pessoas deslocadas localizado próximo dos limites de Anka. “Agora temos muito pouco para comer. Eu ganho a vida vendendo leite de vaca para a população local”.
 
Os 150 leitos da ala pediátrica de MSF no hospital de Anka já estão totalmente ocupados, mas a equipe teme que o pior ainda esteja por vir. “No momento, estamos esgotando nossa capacidade de leitos no hospital de Anka”, disse o dr. Emudanohwo. “As famílias nos contam que não poderão cultivar para a próxima estação, o que significa um novo ciclo de fome. E a época das chuvas ainda está para começar, quando a malária e outras doenças sazonais aumentam. As pessoas aqui precisam de comida, água potável e vacinas agora”.
 
Aumento de sequestros e violência sexual
 
À medida que a violência aumenta, relatos de sequestros, assassinatos, assaltos à mão armada e violência sexual se multiplicam.
 
“De janeiro a abril, nossas equipes em Zamfara receberam mais de 100 sobreviventes de violência sexual”, disse o dr. Noble Nma, coordenador de atividades médicas de MSF em Shinkafi, onde a organização administra uma clínica para vítimas de violência sexual. “Mulheres e às vezes homens são sequestrados por pessoas armadas e violados durante semanas antes de serem devolvidos às suas comunidades. Isso se soma à violência enfrentada pelas mulheres dentro da própria comunidade”.
 
O medo de viajar pelas estradas perigosas significa que os sobreviventes de violência sexual muitas vezes procuram apoio tarde, ou nem o fazem. “Os sobreviventes temem pegar as estradas, então geralmente chegam às nossas clínicas tarde demais para prevenir infecções sexualmente transmissíveis, com traumas mentais graves e precisando urgentemente de proteção”, disse Nma. “Eles nos dizem que há mais vítimas com medo de viajar para cá, por isso tememos estar vendo apenas a ponta do iceberg”.
 
MSF é uma das poucas organizações humanitárias que trabalham no estado de Zamfara. Esta não é a primeira vez que a organização levanta o alarme sobre a necessidade urgente de maior assistência humanitária e proteção na região.
 
“Nossas equipes testemunharam a velocidade com que a situação no estado de Zamfara se deteriorou”, disse Froukje Pelsma, coordenador-geral de MSF na Nigéria. “A vida das pessoas no noroeste da Nigéria agora é dominada pela fome, abuso e doenças evitáveis. O que está acontecendo aqui é uma emergência humanitária que precisa de atenção urgente e uma resposta rápida e adequada. As autoridades e todas os grupos de interesse relevantes devem assumir suas responsabilidades para com as comunidades afetadas”.
 
MSF trabalha no estado de Zamfara, no noroeste da Nigéria, desde 2010. Em Anka, MSF administra uma ala pediátrica com 150 leitos no hospital instalado na região, oferece cuidados básicos de saúde no maior acampamento da cidade para pessoas deslocadas e administra clínicas ambulatoriais de desnutrição na cidade e arredores. Em Shinkafi, MSF administra uma enfermaria de desnutrição com 39 leitos, uma tenda de isolamento para outras doenças e uma clínica para sobreviventes de violência sexual; as equipes também fornecem tratamento em casos de surto de malária. Em Zurmi, MSF apoia um centro de desnutrição pediátrica com 30 leitos e uma clínica para sobreviventes de violência sexual. As equipes de MSF também fornecem suporte de saúde mental em todos esses locais.
 
As equipes de MSF trabalham atualmente em 11 estados da Nigéria: Borno, Jigawa, Zamfara, Sokoto, Benue, Ebonyi, Kano, Bauchi, Katsina, Kebbi e Rivers. MSF trabalha continuamente na Nigéria desde 1996.

 

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