O fim da temporada de malária em Borno, na Nigéria

O estado de Borno precisa de infraestrutura de saúde em funcionamento

O fim da temporada de malária em Borno, na Nigéria

A cada ano, o estado de Borno vê um forte aumento da malária durante a estação chuvosa, afetando gravemente as crianças com menos de 15 anos de idade. Uma combinação de infraestrutura de saúde limitada ou inoperante, medidas preventivas inadequadas e obstáculos para alcançar os profissionais de saúde criaram uma situação em que as mortes relacionadas à malária são quase inevitáveis. Mais de 10 anos de conflito entre os grupos armados de oposição e militares nigerianos compuseram os desafios que as pessoas enfrentam no acesso aos cuidados de saúde, com vastas áreas da população deslocadas e milhões de vidas interrompidas.

De julho a dezembro deste ano, MSF forneceu a mais de 85 mil crianças com menos de 5 anos de idade a quimioprevenção sazonal da malária (SMC, em inglês); o objetivo da SMC é impedir que os pacientes contraiam malária. Somente em Bama, a resposta de MSF à malária incluiu a SMC para mais de 12 mil crianças, durante quatro rodadas de tratamento e mais de mil internações para tratamento da malária grave.  

Este ano, MSF realizou atividades de SMC e tratamento de malária em Banki, Rann, Ngala, Pulka e Bama, além de tratamento para malária grave e malária com complicações na capital do estado, Maiduguri. Apesar dos picos previsíveis da malária (mais de 270 mil casos de malária sem complicações foram registrados no estado de Borno em 2019), serviços de tratamento de organizações como MSF continuam sendo necessários, porque os pacientes têm pouca alternativa.

Em Bama, um hospital geral abrangente estatal parece pronto para admitir pacientes. No entanto, com poucos medicamentos ou recursos humanos, o tratamento de pacientes nesta instituição permanece raro por enquanto. Os custos do sistema público de saúde apresentam uma barreira adicional para muitos, que simplesmente não têm meios para pagar pelo tratamento médico. Este hospital representa a única infraestrutura de saúde permanente para a população de Bama, que agora abriga cerca de 35 mil pessoas deslocadas internamente devido ao conflito em curso, bem como a população anfitriã.

Quando Yagana levou a filha ao centro de tratamento da malária de MSF em Bama em novembro, ela falou sobre os desafios na obtenção de cuidados de saúde para sua família. “Não é como se não houvesse outros provedores de cuidados em Bama, mas MSF nos trata sem cobrar nada. Em outras instalações, é sempre paracetamol e receita médica para comprar os medicamentos em falta na farmácia, e não temos dinheiro”.

A falta de infraestrutura de saúde que funcione em Borno é ainda agravada pelo número de casos médicos na capital do estado, Maiduguri. De julho a novembro, o hospital pediátrico de MSF em Gwange tratou mais de 5 mil casos confirmados de malária, enquanto o centro de alimentação de MSF para crianças desnutridas em Fori admitiu e tratou 146 crianças com malária, que também estavam desnutridas. Embora certamente existam outros hospitais em Maiduguri, poucos oferecem serviços de saúde secundária ou serviços de assistência pediátrica secundária que prestam tratamento para casos complexos de malária. Além disso, poucos ainda prestam assistência médica à população em geral.

Apesar de começar como um projeto para o tratamento da malária, o trabalho de MSF em Bama também cresceu para abranger cuidados pediátricos secundários, admitindo 192 pacientes adicionais para atendimento hospitalar devido à falta de opções de tratamento para a população. No entanto, os adultos também precisam de serviços de saúde. Líder das mulheres, Famata vive em um campo de deslocados internos em Bama e é o primeiro elo de procura em tempos de crise para muitas mulheres no campo. “Se ficarmos gravemente doentes aqui, não há para onde ir. Eu tenho diabetes, mas não há ninguém aqui que possa me tratar. Fui ao hospital geral aqui na cidade de Bama – eles me testaram e disseram que eu tinha diabetes e depois me deram uma receita médica para comprar os remédios – mas não posso comprar o remédio. Muitas mulheres também sofrem de problemas como a fístula, mas não sei para onde levá-las, o mesmo vale para o HIV. Trato meu diabetes tomando cuidado com minha dieta – só como feijão – mas preciso mesmo de medicamentos”.

A ausência de cuidados de saúde abrangentes em Bama e outras ‘cidades de guarnição’ (cidades que são habitadas e guardadas pelos militares nigerianos) é um problema sério para a população; no entanto, elas permanecem visíveis e capazes de expressar suas preocupações; se os desafios daqueles que vivem em cidades da guarnição são terríveis, isso levanta questões difíceis sobre a situação da saúde para aqueles que estão fora das áreas controladas por militares com apoio humanitário limitado, muitos dos quais vivem em áreas controladas por grupos armados da oposição.

“Se as autoridades estaduais de saúde puderem garantir o funcionamento diário de seus hospitais em cidades como Bama, isso permitiria que organizações como MSF aumentassem outros aspectos da cobertura de saúde no estado de Borno, como desnutrição, surtos de doenças ou cuidados maternos”, diz David Therond, coordenador-geral de MSF.

Se uma cobertura maior de assistência médica for obtida, mais deve ser feito para garantir que serviços de assistência médica acessíveis estejam disponíveis para a população em geral em Borno. Com ênfase nos recursos humanos apropriados e no fornecimento de medicamentos, há muito mais a ser feito.

Com o fim da estação das chuvas e o pico dos casos da malária, o projeto de MSF em Bama agora está encerrado. MSF trabalha continuamente na Nigéria desde 1996 e no estado de Borno desde 2014. Atualmente, a organização realiza atividades médicas em oito estados do país. MSF abriu um centro de alimentação terapêutica em Bama em 2018 para tratar a desnutrição. De julho a dezembro de 2019, MSF reabriu o projeto Bama para tratar a malária grave.

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