Programa de reabilitação de MSF em Cali é assumido pelas autoridades locais

Centro de reabilitação único na Colômbia já auxiliou a recuperação de mais de 2.700 vítimas da violência urbana em Cali. Agora, equipe se prepara para integrar o programa ao hospital público local.

Após 6 anos oferecendo atendimento a vítimas de violência, o projeto de reabilitação de MSF em Cali, Colômbia, está sendo repassado às autoridades locais. O programa, que oferece tratamento de fisioterapia, suporte psicológico, atendimento de enfermagem, além de apoio social e serviços de transporte, já auxiliou a recuperação de mais de 2.700 vítimas de violência física.

A equipe do centro de reabilitação, composta por 18 profissionais de MSF e 35 voluntários da comunidade, se prepara agora para integrar o programa ao hospital público Marroquin Cauquita. Esta transferência só será possível porque houve compromisso financeiro e político das autoridades locais, que alocaram 12 funcionários da rede pública de saúde para comporem a equipe do programa de reabilitação. Além disso, eles demonstraram compromisso com um plano de quatro anos e investirão US$90 milhões em obras no hospital para integrar o programa de reabilitação.

“Acreditamos que, ao fazer uso da nossa experiência, as autoridades locais assumiram sua responsabilidade de assegurar que mais pessoas tenham acesso ao tipo de atendimento que nós oferecemos”, explica Antônio da Silva, brasileiro que coordena o trabalho de MSF na Colômbia. “O modelo pode ser aplicado a todas as estruturas de saúde onde a violência urbana é considerada um problema de saúde pública”, acrescenta. Para garantir a continuidade do trabalho, MSF está treinando médicos e enfermeiros locais há 4 meses.

Na Colômbia, a violência urbana é a primeira causa de morte entre homens com idade entre 14 de 44 anos e um grave problema de saúde pública em Cali, a terceira maior cidade da Colômbia. Nos primeiros seis meses de 2004, 1.225 assassinatos foram registrados na cidade. Esses dados não incluem as mortes relacionadas ao conflito armado contínuo na Colômbia.

Na periferia da maioria das cidades da Colômbia, muitos jovens pertencem a gangues que definem “territórios”, com fronteiras invisíveis conhecidas apenas por eles e seus inimigos. Para eles, as regras são claras, e transpor os limites dessas zonas de segurança pode ter conseqüências fatais. “A maioria dos nossos beneficiários tem entre 14 e 25 anos de idade. Todos eles apresentam ferimentos causados por arma de fogo ou faca e muitas vezes são membros de gangues”, diz Antônio.

Mas nem todas as vítimas pertencem às gangues de Cali. Muitas são pessoas inocentes que simplesmente estavam no lugar errado na hora errada. Jennifer Espinosa e sua filha, Daniela, foram gravemente feridas quando alguém atirou uma granada a uma festa de aniversário. Com apenas 18 anos de idade, Jennifer precisava de uma cadeira de rodas para se locomover e Daniela se movia com dificuldade e precisava de cirurgia. Após extenso tratamento no centro de MSF, Jennifer não utiliza mais a cadeira de rodas e recuperou os movimentos do braço.

“O grau de recuperação física e psicológica depende quase exclusivamente da qualidade da atenção oferecida ao paciente”, explica Juan Carlos Torres, um dos psicólogos do centro de MSF. Roger Micolta, fisioterapeuta da equipe, acrescenta: “Nós sabemos das limitações que as lesões impõem e é possível definir parte do nosso trabalho com base nessa premissa. Mas a forma como o paciente reage, a forma como escolhe lutar e se ajudar nessa recuperação é algo muito mais difícil de definir”.

O Centro de Reabilitação foi criado em 1998 para responder à falta de atenção integral às pessoas vítimas da violência urbana, após receberem alta das unidades de emergência dos hospitais locais. Por isso, a fase atual do projeto inclui treinamento de profissionais de 11 centros de saúde no distrito de Aguablanca e nos hospitais em Cali. “Este modelo de intervenção junto a vítimas de violência urbana e suas famílias, único na Colômbia, demonstrou que o setor de saúde tem um papel muito importante na redução dos efeitos físicos, psicológicos e sociais da violência nas cidades”, diz Antônio da Silva.

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