RDC: surto de febre tifoide sob controle em Popokabaka

Equipe de MSF ajuda a controlar surto de febre tifoide na província de Kwango; coordenador-médico faz retrospectiva dos últimos dois meses

Médico de MSF José Mbuta se arrumando antes de entrar na sala de cirurgia do Hospital Geral de Referência de Popokabaka. Foto por: Franck Ngonga

Um surto de febre tifoide potencialmente mortal em Popokabaka, província de Kwango, foi finalmente controlado com a ajuda de uma equipe de emergência de Médicos Sem Fronteiras (MSF). Localizada nas colinas na confluência de três rios, a zona sanitária de Popokabaka –  quase 400 km a sudeste de Kinshasa – foi o centro do surto que durou meses. Jean-Marc Mavunda, coordenador-médico da equipe, faz uma retrospectiva dos últimos dois meses.

“Nossa equipe foi chamada para responder em Popokabaka depois que as autoridades confirmaram a epidemia”, disse Jean-Marc Mavunda, coordenador médico da equipe de emergência de MSF. “Mas tudo indicava que a doença já estava presente havia vários meses e já havia ceifado muitas vidas”.

Geralmente transmitida pela ingestão de água ou alimentos contaminados com fezes e secreções humanas, ou então por contato direto, os principais sintomas da febre tifoide são febre prolongada, dor de cabeça e problemas digestivos, incluindo dores de estômago, vômitos e diarreia.

Uma vez diagnosticada, a febre tifoide pode ser tratada em apenas alguns dias com o uso de antibióticos. Mas pode ser difícil diagnosticar, principalmente nos centros de saúde locais, porque seus sintomas são muito semelhantes aos de outras doenças e porque é necessária uma análise laboratorial. Quando o tratamento é adiado, a febre tifoide pode levar a complicações graves e, às vezes, à morte.

“Como esperar que vamos evitar a doença?”

Esta manhã, Chadrac Mbaya está sentado ao lado de sua filha de um ano, La Joie. La Joie foi admitida no hospital Popokabaka há quatro dias com sintomas de febre tifoide.

“Uma noite ela começou a vomitar e a ter diarreia”, diz o pai. “Fomos ao posto de saúde, mas o tratamento que ela recebeu não melhorou sua condição. Ela acabou sendo transferida para cá. A irmã dela também teve a doença, mas felizmente ela se recuperou”.

As condições de vida das pessoas em Popokabaka indicam que os surtos de doenças transmitidas pela água são comuns. O acesso à água potável é limitado, enquanto as instalações sanitárias são quase inexistentes na maioria das casas dos habitantes locais.

“Nesta região, as pessoas bebem água do rio, onde também tomamos banho e lavamos a louça”, diz Chadrac. “Como esperar que vamos evitar a doença?”

 

Para reduzir o risco das pessoas de contrair a doença no seu dia a dia, promotores de saúde de MSF realizaram sessões de conscientização em escolas, centros de saúde e na comunidade. Enquanto isso, as equipes de MSF rastrearam o curso da doença em toda a região para responder com rapidez e eficácia.

“Além do apoio ao atendimento e sensibilização [da comunidade], realizamos vigilância epidemiológica de toda a zona para adequar nossa resposta à evolução da situação”, diz Mavunda. “Esse trabalho revelou rapidamente que o número de casos era muito maior do que o estimado inicialmente. Todos os dias, o hospital recebia pacientes com febre tifoide encaminhados de centros de saúde periféricos. No total, estima-se que mais de 3.700 pessoas foram afetadas desde o início do ano”.

Cirurgia para pacientes com complicações

Endêmica na África Subsaariana, a febre tifoide pode causar complicações graves em 10 a 15 por cento dos pacientes, incluindo hemorragia digestiva, perfuração intestinal e peritonite, que exigem cirurgia.

“Dado o número de casos complicados na área, integramos diretamente um componente cirúrgico em nossa resposta”, diz Mavunda. “Já lidamos com muitos casos de peritonite, uma infecção grave que pode facilmente levar à morte. A peritonite aguda às vezes requer várias operações no mesmo paciente. Antes de MSF iniciar sua intervenção, 29 mortes em hospitais foram relatadas, quase todas no pós-operatório. Por isso, foi fundamental fornecer suporte cirúrgico e cuidados pós-operatórios“.

Tharcisse, de onze anos, desenvolveu complicações de febre tifoide e já visitou a sala de cirurgia quatro vezes.

“As três primeiras operações foram realizadas em maio e junho”, diz o pai, também chamado de Tharcisse. “Depois das duas primeiras, a situação não melhorou. Eu estava prestes a levá-lo a Kinshasa para ser tratado lá, mas quando soube que a equipe de MSF havia chegado, decidi esperar. E foi a equipe de MSF que organizou o restante das operações”.

Mabweni, de três anos, também teve que ser operado pela segunda vez depois de ter sido internado no hospital de Popokabaka com complicações de febre tifoide.

“Ele foi operado pela primeira vez no dia 4 de julho”, diz seu pai Julva. “Três dias depois, houve outras complicações e ele teve que fazer outra operação. Isto já foi feito e estamos esperando que ele se recupere para ir para casa”.

De meados de julho a meados de setembro, 2.180 pacientes foram tratados e 20 operações cirúrgicas foram realizadas com o apoio de MSF. Além de tratar a febre tifoide, a equipe de MSF também operou 11 pessoas para emergências cirúrgicas e tratou mais de 3.500 pacientes sofrendo de malária simples e grave.

Os casos de febre tifoide já estão diminuindo, o que permite que a equipe de MSF responda a emergências em outras partes do país, mas os profissionais das unidades de saúde em toda a região precisarão estar vigilantes nas próximas semanas. Água, higiene e saneamento – os principais fatores na propagação da febre tifoide – ainda estão muito abaixo do que é necessário na região de Popokabaka, e o início da estação chuvosa pode levar a um aumento dos casos.

Antes de ir para outro lugar, a equipe de emergência de MSF doou medicamentos, equipamentos médicos e cirúrgicos ao hospital de Popokabaka para fortalecer o atendimento, mas é necessária uma resposta mais estrutural para melhorar as condições de vida das pessoas e combater a doença em sua origem.

A equipe de emergência de MSF apoiou o Ministério da Saúde no tratamento de pacientes com febre tifoide no hospital Popokabaka e em outras sete unidades de saúde na cidade e seus arredores, de meados de julho a meados de setembro de 2021.

 

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