Refugiados sírios no Líbano: vivendo com diabete

Tratamento contínuo de doenças crônicas é uma dificuldade em meio a condições de vida precárias

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Desde 2012, MSF oferece tratamento para doenças crônicas, como diabete e hipertensão, no hospital de Dar Al-Zahra, em Trípoli, e em quatro clínicas no Vale do Bekaa. O programa foi desenvolvido em resposta à alta taxa de morbidade observada entre a população de sírios refugiados no Líbano nos primeiros meses da crise. Até o momento, mais de 50 mil pessoas com doenças crônicas foram beneficiadas com cuidados gratuitos por mais de dois anos, confirmando a importância do programa para milhares de pessoas.

Uma doença de longo prazo que demanda monitoramento regular

“A diabete é um distúrbio do metabolismo do açúcar no corpo, que causa grande concentração de glicose no sangue”, explica a Dra. Maria Lightlower, líder das atividades médicas no Líbano. “O pâncreas, que é responsável pela produção da insulina, hormônio que regula os níveis de glicose, passa a não fazer seu trabalho ou a fazê-lo de forma inadequada. Por isso, essa doença demanda monitoramento constante e tratamento específico, juntamente com a supervisão da dieta do paciente.” A pessoa com diabete nunca se cura e a doença muda com o tempo. Os pacientes precisam regular os níveis de açúcar em seu sangue por meio de injeções de insulina ou de uma rígida dieta, na medida em que mantém a prática de atividades físicas regulares. Se falharem, podem vivenciar complicações graves e incapacitantes.

“Uma das complicações mais comuns é a perda de sensibilidade, primeiramente das pernas e dos pés”, ressalta a Dra. Maria Lightlower. “A circulação do sangue de forma precária pode causar úlceras e infecções que, se não forem tratadas, podem levar à amputação. Lesões podem também prejudicar os vasos sanguíneos que alimentam a retina, causando redução da acuracidade visual e, possivelmente, cegueira.” As principais estratégias para tratar a diabete continuam sendo a educação do paciente e o estilo de vida saudável.

Condições de vida precárias com consequências perigosas

“Perdi tudo na guerra, tudo”, conta Mohammad, que está refugiado no Líbano há dois anos. “Hoje, tenho grande responsabilidade perante minha família. Tenho que cuidar deles. Então, procuro garantir que não deixe de fazer qualquer coisa que possa causar a amputação de um de meus pés, por exemplo. Já vi isso acontecer a outros diabéticos. O médico explicou claramente como cuidar de mim e minha esposa é muito atenciosa com a minha dieta.”

Para milhares de sírios como Mahammad, a vida com diabete no Líbano permanece uma batalha silenciosas contra o relógio. A falta de recursos os impede de se alimentarem de forma regular e as complicações resultantes dessa instabilidade os deixa ainda mais vulneráveis, principalmente porque enfrentam também dificuldades para obter cuidados médicos.

Cuidados médicos inacessíveis

O custo do transporte, das visitas médicas e do tratamento são enormes obstáculos em um país onde o sistema de saúde é privatizado. Embora o Alto Comissariado das Nações Unidas cubra 75% dos custos médicos, os pacientes são responsáveis pelos 25% restantes, bem como por algumas taxas laboratoriais. Em última instância, o valor é alto para famílias que já enfrentam dificuldades para pagar por moradia e comida.

“Nós fugimos de Raqqa, na Síria, com minhas irmãs e meus pais”, conta Amina. “Nossa casa foi bombardeada. Depois de diversas semanas no Líbano, fiquei sem insulina. Então, voltei para a Síria com meu pai, onde os custos de um tratamento correspondem a um terço do valor que é cobrado aqui.”

Amina e sua família – sete pessoas no total – estão vivendo debaixo de uma lona em Majdel Anjar, no Vale do Bekaa. Eles estão no Líbano há mais de um ano. Alguns dias, o pai encontra trabalho. As meninas ajudam com as tarefas da casa enquanto esperam por um retorno possível. “Eu tinha quatro anos de idade quando fui diagnosticada com diabete”, conta a menina de 19 anos. “Sempre tive insulina, menos desde que vim morar aqui, porque é muito caro.”

Além dos custos consideráveis que os refugiados precisam pagar pelo tratamento para diabete, alguns desafiam a doença conscientemente, diante da fadiga e da percepção de que eles não têm futuro. “Por que continuar vivendo sob essas condições?”, diz Ismael. “Se vou morrer, vou morrer. Então, fumo.”

Os milhares de refugiados sírios diabéticos precisam redobrar seus esforços para prevenir que os traumas resultantes do exílio afetem sua saúde. A chegada do inverno no Líbano vai apenas aumentar o desafio, na medida em que a guerra continua.

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