Zimbábue: como educadoras levam informação e acesso à saúde a profissionais do sexo

Iniciativa apoiada por MSF capacita jovens mulheres para serem pontes entre suas comunidades e cuidados de saúde essenciais

Jaya conversa com Ruvimbo (de moletom preto), mobilizadora de comunidade de MSF, sobre a importância de dar apoio a outras profissionais do sexo. ©Lourino Pelembe/MSF

Para mulheres profissionais do sexo de Mbare e Epworth, no Zimbábue, as ruas são mais do que um local de trabalho: elas são um campo de batalha. A violência, o estigma e a falta de acesso à saúde há muito definem suas vidas. No entanto, uma rede crescente de jovens mulheres, apoiada por Médicos Sem Fronteiras (MSF), está reescrevendo essa narrativa. Além de acessarem serviços essenciais de saúde, elas estão se transformando em educadoras, fazendo a ponte entre suas comunidades e cuidados que salvam vidas.

Zira*, mãe e uma das educadoras do projeto de MSF em Mbare, relembra a noite que mudou sua vida. “Engravidei sem saber. Eu não sabia sobre contracepção”, relata.

Por meio do programa de MSF, Zira aprendeu a se proteger, teve acesso a métodos contraceptivos, tratamento de infecções sexualmente transmissíveis (ISTs) e serviços de prevenção à infecção pelo HIV.

Sua jornada não parou por aí. Ela sentiu que precisava garantir que outras jovens não enfrentassem as mesmas lutas.

Leia também:

Jovens educadoras apoiando outras jovens mulheres a fazer escolhas de saúde

Maida* descreve a difícil realidade que jovens profissionais do sexo, como ela, enfrentam. “Às vezes, um cliente se recusa a pagar depois dos serviços. Se você pedir o pagamento, eles te ameaçam ou até te batem”, diz.

Além da violência, o acesso à saúde continua sendo um desafio. O estigma nas clínicas muitas vezes desencoraja a procura por ajuda. “Você entra em uma clínica apresentando uma IST e, antes mesmo de explicarem mais, eles começam a te julgar”, relata Maida.

Quando há confiança, há aceitação. Quando há aceitação, a mudança de comportamento acontece.”
– Samuel Sithole, coordenador de promoção da saúde de MSF

Apesar desses desafios, mulheres como Zira e Maida estão fazendo a diferença. Como educadoras de outras pessoas na mesma situação, elas distribuem preservativos, prestam serviços básicos de saúde, compartilham conhecimento e incentivam a procura por atendimento médico.

“Muitas não sabem seus direitos ou onde conseguir ajuda”, diz Zira. “Então eu vou até elas: nos bares, nas ruas. Eu pergunto — você tem camisinha? Você sabe onde fazer o teste?”

Maida relata que para muitas profissionais do sexo o acesso à saúde continua sendo um desafio. ©Lourino Pelembe/MSF

O impacto das atividades apoiadas por MSF em Mbare e Epworth está sendo transformador. Zira se lembra de uma adolescente sobrevivente de violência sexual que, sem ter conhecimento, vivia com HIV. “Ela não sabia que vivia com o HIV. Os pais dela também não. Eu a levei para a clínica, e ela conseguiu a ajuda que precisava”, relembra Zira.

O modelo de educação de pares promove confiança dentro da comunidade, incentivando mais jovens profissionais do sexo a procurar atendimento médico. Muitas mulheres precisam de serviços adicionais, como apoio econômico e melhores instalações de saúde. “Estou envelhecendo”, diz Zira. “Um dia, não vou mais estar apta para esses serviços. O que acontecerá, então?”.

Mulheres que lideram

Samuel Sithole, coordenador de promoção de saúde de MSF, enfatiza a importância do modelo de levar informação e acesso à saúde adiante. “Muitas profissionais do sexo não confiam nos profissionais de saúde tradicionais, mas confiam em alguém que passou pela mesma experiência. Quando há confiança, há aceitação. Quando há aceitação, a mudança de comportamento acontece”, explica.

● Fique por dentro: superar tabus para garantir a saúde sexual e reprodutiva das mulheres

Jaya*, que fez a transição de paciente para educadora, destaca a necessidade de apoio contínuo. “Antes, eu não pensava na minha saúde. Mas MSF me empoderou — agora ensino outras pessoas sobre a importância da proteção”, diz ela. Jaya também ressalta a necessidade de ampliação de serviços, como acesso a preservativos e lubrificantes, para garantir práticas mais seguras.

MSF atua no Zimbábue oferecendo serviços de saúde sexual e reprodutiva a adolescentes e jovens, desde 2016. ©Lourino Pelembe/MSF

Os desafios são significativos, mas a resiliência dessas mulheres é inegável. No mês que marca o Dia Internacional da Mulher, honramos sua coragem e determinação. Elas não estão apenas sobrevivendo: estão liderando, transformando suas comunidades e provando que, mesmo diante do medo, a força pode prevalecer.

Desde 2016, MSF trabalha no Zimbábue, oferecendo serviços de saúde sexual e reprodutiva a adolescentes e jovens, em colaboração com o Ministério da Saúde e Assistência à Infância.

A abordagem integrada inclui triagem e tratamento de ISTs e infecções por HIV, planejamento familiar, aconselhamento em saúde mental e apoio psicossocial.

Somente em 2024, MSF realizou mais de 8.400 consultas, muitas para populações em situação de vulnerabilidade, como jovens profissionais do sexo, em Mbare.

 

*Nomes alterados para proteger a privacidade e integridade das pacientes

 

Compartilhar